
A ocorrência de linfomas em sistema nervoso central (SNC) é rara e mais associada a linfoma difuso de grandes células B (LDGB). Outros tipos histopatológicos de linfoma primário de SNC são ainda mais raros. Não há consenso na abordagem diagnóstica e terapêutica de linfomas raros de SNC.
Caso clínicoPaciente feminina, 63 anos, hipertensa e diabética, apresentou afasia e hemiparesia direita completa e proporcionada. Realizou ressonância magnética (RM) de crânio com contraste julho/21 que evidenciou lesão expansiva extra-axial com impregnação pelo meio de contraste em região frontoparietal esquerda, com comprometimento ósseo e extensão extra-craniana. Foi encaminhada para serviço de neurocirurgia com suspeita de meningioma e realizou craniotomia com ressecção da lesão em novembro/21. RM de crânio no pós-operatório sem sinais de acometimento tumoral. Deu entrada no serviço de Hematologia do Hospital de Base do Distrito Federal em janeiro/22 com resultado de biópsia da lesão que apresentava denso infiltrado de linfócitos pequenos expressando positividade para CD20, BCL2 e Ki67 15-20%, sugestivo de linfoma de zona marginal extranodal. Realizou tomografias de estadiamento sem sugestão de doença sistêmica. Iniciada quimioterapia (QT) metrotrexato (MTX) em alta dose (3 g/m2). Paciente realizou 3 ciclos de MTX. PET-CT após quimioterapia mostrou heterogeneidade do metabolismo frontoparietal esquerdo, podendo corresponder a alterações pós-tratamento e RM de crânio com alterações pós cirúrgicas e sem remanescente tumoral. Não foi feito novo ciclo de QT e radioterapia não indicada pelo serviço de referência.
DiscussãoO linfoma não-Hodgkin (LNH) primário de SNC corresponde a menos de 1% de todos os casos LNH e usualmente são neoplasias agressivas e com prognóstico reservado. O linfoma de zona marginal extranodal de SNC é o linfoma de SNC de baixo grau mais comum e tem bom prognóstico. Devido à sua raridade não existem estudos para avaliar as diferentes opções de tratamento. Em 2017 Ayanambakkam, A et al. publicaram revisão de 70 relatos de caso de linfoma de zona marginal extra nodal de sistema nervoso central e compilaram dados que mostram predominância no sexo feminino e idade média ao diagnóstico de 55 anos. Assim como nossa paciente, a suspeita inicial mais comum após exame de imagem nesses casos foi de meningioma. Também descreveram sintomas iniciais variados, sendo os mais comuns dor de cabeça e crise convulsiva. Os tratamentos mais comuns nessa revisão foram radioterapia isolada, radioterapia associada à cirurgia e cirurgia isolada. Esquemas de QT também foram descritos, incluindo QT sistêmica e associação com QT intratecal. O MTX em alta dose foi escolhido em nosso serviço, mas embora o caso tenha sido discutido em equipe, por tratar-se de caso muito raro, não houve consenso quanto ao tratamento inicial. Além disso, observamos que a paciente realizou o primeiro exame de imagem em junho/21 e somente iniciou acompanhamento com equipe de hematologia em janeiro/22.
ConclusãoO linfoma de zona marginal extranodal de sistema nervoso central é uma entidade rara cujo manejo apresenta dificuldades pela falta de estudos disponíveis. O bom prognóstico independente da modalidade de tratamento possibilita abordagens iniciais menos agressivas e com menor perfil de toxicidade. As dificuldades de acesso e infra-estrutura do Sistema Único de Saúde por vezes dificultam a tomada de decisões, pois acarretam em dificuldades de diagnóstico e seguimento.