
Identificar fatores associados à não-adesão ao tratamento de crianças com doença falciforme diagnosticadas pela triagem neonatal, em estado do Nordeste brasileiro.
MetodologiaForam entrevistados 76 cuidadores de crianças entre 01 e 10 anos, com doença falciforme (DF), acompanhadas em serviço de referência. As variáveis de possível associação com a adesão foram idade da criança, escolaridade do principal cuidador, renda mensal familiar, local de moradia, histórico de irmãos com DF, percepção sobre a saúde da criança, idade de coleta do teste do pezinho, idade da primeira consulta e suporte da atenção primária. Os critérios para boa adesão foram: uso de ácido fólico, penicilina e hidroxiuréia conforme prescrição; aplicação de vacina antipneumocócica 23-valente e realização de estudo doppler transcraniano (DTC) em crianças maiores de 02 anos; comparecimento em 03 consultas no último ano (no mínimo); comparecimento nas datas agendadas para consulta; realização de exames solicitados. Fez-se o cálculo de escore para adesão terapêutica, baseado na relação entre total de adequações encontradas e total de itens possíveis, de acordo com a idade da criança. A adesão foi considerada satisfatória para escore igual ou superior a 80%. Os dados foram analisados pelos testes estatísticos qui-quadrado e regressão logística múltipla. A pesquisa aprovada por Comitê de Ética em Pesquisa (CAAE 63579122.3.0000.5269).
ResultadosSegundo 84,2% dos responsáveis, houve uso adequado de ácido fólico. Entre cuidadores das 45 crianças com indicação, viu-se que 77,7% relataram uso diário de penicilina. Das 24 crianças que recebem hidroxiuréia, 75% dos responsáveis afirmaram o uso conforme prescrição. Nas crianças acima de 02 anos, o DTC foi realizado por 69,3% delas e 83,9% receberam a adaptação do esquema vacinal. Entre 61,8% dos entrevistados, não houve relato de absenteísmo em consultas e 63,2% realizaram exames complementares na periodicidade solicitada. Apenas 59,2% dos cuidadores tiveram adesão global satisfatória. No modelo de regressão logística múltipla, pacientes cuja renda familiar era de, pelo menos, 01 salário-mínimo mensal apresentaram 8,4 vezes mais chance de boa adesão ao tratamento do que aqueles que recebem exclusivamente auxílios governamentais (R2 = 0,60 p = 0,009 IC95% = 1,7- 40,9). Observou-se que crianças acima de 02 anos possuem 3,5% mais probabilidade de má-adesão quando comparados às crianças mais jovens (p = 0,04 IC95% = 0,001 - 0,860).
DiscussãoA adesão é definida pela Organização Mundial de Saúde como a extensão na qual o comportamento do paciente (ou cuidador) coincide com o plano acordado com os profissionais de saúde. Diversos trabalhos identificam as más condições socioeconômicas como principal motivo da perda de seguimento nos pacientes pediátricos com enfermidades crônicas, gerando restrições para continuidade do cuidado multidisciplinar. Entre portadores de doenças crônicas, já foi demonstrado que a adesão dos pacientes mais velhos com estigmas internalizados tende a ser menor quando se compara à criança mais jovem, cuja responsabilidade na adesão é assumida prioritariamente pelos pais ou cuidadores.
ConclusãoVerificou-se que, entre a população entrevistada, a adesão ao tratamento ainda apresenta níveis inadequados, sendo que faixa etária e vulnerabilidade econômica estiveram associadas ao desfecho.