
O mieloma múltiplo (MM) é uma neoplasia hematológica caracterizada pela proliferação desregulada de plasmócitos na medula óssea, representando 1% das neoplasias malignas. No Brasil, entre 2020 e 2023, foram diagnosticados 16.113 novos casos. Cerca de 5-15% dos pacientes com MM desenvolvem amiloidose primária (AL), uma condição rara associada à secreção de cadeias leves de imunoglobulina pelas células neoplásicas, que formam fibras amiloides depositadas em vários tecidos, causando danos orgânicos. Relatamos o caso de um paciente com MM de cadeias leves Kappa/Lambda e comprometimento sistêmico por AL.
Relato de casoEC, homem, 60 anos, natural e procedente de Fortaleza-CE, procurou assistência médica em abril de 2023 com sintomas de síncope, astenia, calafrios e dores intensas. Exames iniciais revelaram hipotensão ortostática severa e nefropatia com proteinúria de 3,5 g/24h e Cr: 1,79 mg/dL. O ecocardiograma mostrou miocárdio hiperecogênico com sinais de depósito no ventrículo esquerdo. O hemograma revelou picos monoclonais gama, anemia leve com Hb: 10,2 g/dL e hemácias: 3,45 milhões/mm³. O paciente também apresentou perda ponderal de 24% em 3 meses. Em junho de 2023, biópsia de coxim gorduroso mostrou depósitos amiloides, confirmando AL e TC evidenciou áreas ósseas líticas. Em julho de 2023, mielograma e citometria da medula óssea indicaram medula hipercelular para a idade com hiperplasia de três linhagens celulares e plasmocitose. A imunofenotipagem revelou positividade para CD138 e CD38, com clonalidade Kappa/Lambda inconclusiva. Em agosto de 2023, estudo imuno-histoquímico diagnosticou MM com deposição sistêmica de proteína amiloide e relação Kappa/Lambda de 1/15. Com o diagnóstico de MM, o paciente iniciou 8 ciclos de quimioterapia com ciclofosfamida, dexametasona e bortezomibe, além de pamidronato. Relatou manchas equimóticas e edema em pés, mãos e região periorbitária. Atualmente (04/08/2024), está internado em estado estável, aguardando transplante de medula óssea previsto para 07/08.
DiscussãoO mieloma múltiplo e a amiloidose são doenças proliferativas das células plasmáticas, classificadas como gamapatias monoclonais. Em um paciente com mieloma múltiplo, a presença de síndrome nefrótica, miocardiopatia, equimoses periorbitárias, entre outros sinais, deve suscitar a suspeita de amiloidose primária. A combinação de mieloma múltiplo e amiloidose indica um mau prognóstico. O tratamento dessas duas doenças requer quimioterapia e, em alguns casos, transplante de medula óssea. O uso de novos medicamentos, bem como a seleção criteriosa dos candidatos ao transplante de medula, pode melhorar a sobrevida desses pacientes com neoplasias hematológicas ainda incuráveis.
ConclusãoO caso demonstra a complexidade do manejo clínico de pacientes com MM associado à AL. A coexistência dessas condições agrava o prognóstico, exigindo abordagem terapêutica multifacetada. A combinação de quimioterapia e transplante de medula óssea é fundamental, com novos fármacos e seleção de candidatos ao transplante potencialmente melhorando a sobrevida. A natureza incurável dessas neoplasias ressalta a necessidade de pesquisa contínua e desenvolvimento de novas estratégias terapêuticas. O acompanhamento contínuo e manejo adequado das complicações são cruciais para a qualidade de vida desses pacientes, evidenciando a importância de uma abordagem integrada e personalizada.