A leucemia é a neoplasia mais prevalente na infância e frequentemente cursa com neutropenia, aumentando o risco de infecções graves e deterioração clínica. A Escala de Valoración de Alerta Temprana (EVAT) é uma ferramenta padronizada que avalia parâmetros como sinais vitais, nível de consciência e preocupação da equipe de enfermagem e acompanhantes, permitindo identificar precocemente pacientes em risco de deterioração clínica. Sua aplicação contínua em enfermarias oncológicas pediátricas possibilita intervenções rápidas, mesmo em ambientes com recursos limitados.

Analisar o papel da EVAT na vigilância clínica de crianças com leucemia e neutropenia, identificando sinais precoces de deterioração clínica e contribuindo para intervenções oportunas.

Estudo de coorte retrospectiva com pacientes pediátricos com Leucemia Linfoide Aguda (LLA) e Leucemia Mieloide Aguda (LMA), acompanhados pela EVAT entre 2021 e 2024, em enfermaria da oncologia pediátrica de um centro de referência. Foram incluídos os casos com deterioração clínica com necessidade de transferência para Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Variáveis clínicas e laboratoriais foram analisadas, com ênfase na presença de neutropenia.

Entre 151 eventos críticos detectados pela escala EVAT no período, 88 ocorreram em pacientes com leucemia (LLA: 76%; LMA: 24%), sendo 64 neutropênicos. A maioria era do sexo masculino (60,2%), com mediana de idade de 9 anos. Sepse/choque séptico foi a principal causa de deterioração clínica com transferência para UTI, presente em 86% dos casos. Quanto ao suporte intensivo desses pacientes, 23% usaram drogas vasoativas e 20% necessitaram ventilação mecânica. Hemoculturas foram positivas em 42% dos pacientes neutropênicos , com 48% de bactérias gram-negativas, 11% gram-positivas, 15% fungos e 26% com coinfecção fúngica-bacteriana. Klebsiella pneumoniae e Candida tropicalis foram os agentes mais prevalentes. Dos 13 óbitos registrados entre os pacientes com leucemias agudas que foram transferidos para UTI através da escala EVAT, 77% ocorreram em pacientes neutropênicos, sendo sepse a causa principal (71% dos casos). Não houve registro de eventos críticos em enfermaria entre esses pacientes, o que demonstra a efetividade da escala na identificação precoce da deterioração clínica e na prevenção de desfechos graves.

A neutropenia demonstrou ser um fator determinante na evolução clínica de crianças com leucemia aguda, associando-se a quadros mais graves, maior necessidade de suporte intensivo e aumento do risco de mortalidade. A aplicação sistemática da escala EVAT demonstrou ser eficaz na detecção rápida de sinais de instabilidade, possibilitando intervenções oportunas , como a transferência precoce para a UTI, e contribuindo para a ausência de eventos críticos em enfermaria, como paradas cardiorrespiratórias. Além de fortalecer a segurança assistencial, sua implementação organizou o processo de vigilância clínica mesmo em cenários com recursos limitados. A alta incidência de infecções graves e coinfecções entre pacientes neutropênicos reforça a vulnerabilidade desse grupo e a importância de monitoramento contínuo. Nesse contexto, a aplicação da escala EVAT se consolida como uma estratégia viável, segura e com impacto clínico relevante no cuidado de crianças com neoplasias, especialmente aquelas com leucemias agudas.