HEMO 2025 / III Simpósio Brasileiro de Citometria de Fluxo
Mais dadosA associação entre leucemia mieloide aguda (LMA) e mieloma múltiplo (MM) é extremamente rara. Relatos de coexistência levantam hipóteses sobre predisposição genética, imunossupressão ou efeito tardio do tratamento citotóxico.
Descrição do casoPaciente masculino, 54 anos, histórico de diabetes mellitus tipo 2, e diagnóstico prévio de leucemia promielocítica aguda (LPA), de risco intermediário, tratado com protocolo AIDA 2000, atualmente em remissão. Realizando manutenção com ácido transretinóico (ATRA). Apresentou múltiplas internações nos últimos meses, por pneumonia, tratados com diversos esquemas antibióticos, além de fratura de arco costal. Devido a suspeita de MM, foi solicitada eletroforese de proteínas com imunofixação, que mostrou pico monoclonal IgG kappa (3,64 g), com razão kappa/lambda 137,91, e beta 2 microglobulina 3,11 mg/L. A ressonância magnética de coluna revelou lesões suspeitas em L4, e o inventário ósseo lesões líticas crânio-vertebrais. Exames laboratoriais e de imagem confirmam infiltração plasmocitária em medula óssea. Foi iniciado tratamento com Dara-VTD (daratumumabe, talidomida, bortezomibe e dexametasona), com resposta hematológica parcial com redução progressiva do pico monoclonal para 0,39 g após 6 ciclos, caracterizando resposta muito boa parcial. Subjetivamente, o paciente se encontra assintomático, foi solicitado lenalidomida e aguarda transplante de medula óssea autólogo.
ConclusãoA ocorrência simultânea ou sequencial de duas neoplasias hematológicas distintas, é extremamente rara e desafiadora tanto do ponto de vista diagnóstico quanto terapêutico. No presente caso, a paciente, previamente tratada e em remissão de LPA, evoluiu com achados laboratoriais e clínicos sugestivos de gamopatia monoclonal. O diagnóstico de mieloma múltiplo foi estabelecido por biópsia de medula óssea, com infiltração plasmocitária, imunofenotipagem e evidência laboratorial de componente monoclonal. A presença de duas doenças hematológicas distintas na mesma paciente levanta importantes hipóteses fisiopatológicas. Embora não exista relação causal direta estabelecida entre LPA e mieloma múltiplo, alguns relatos sugerem que o tratamento citotóxico prévio, em especial com agentes alquilantes ou inibidores de topoisomerase, pode contribuir para a emergência de neoplasias secundárias. Outra hipótese considerada é a existência de uma predisposição clonal ou microambiental comum, que favoreça o surgimento de ambas as neoplasias. A sobreposição de diagnósticos traz implicações clínicas importantes. A imunodeficiência associada à LPA, somada à disfunção imune característica do mieloma, pode aumentar a susceptibilidade a infecções e dificultar a resposta terapêutica. Além disso, a abordagem terapêutica do mieloma em um paciente previamente tratado para LPA requer cautela, considerando o histórico de toxicidade, idade e reserva medular. O caso reforça a importância da vigilância hematológica prolongada em pacientes curados de neoplasias hematológicas, mesmo após longos períodos de remissão. A persistência de sintomas como anemia inexplicada, dor óssea ou gamopatias monoclonais deve sempre levantar a suspeita de uma segunda malignidade, mesmo que incomum.




