HEMO 2025 / III Simpósio Brasileiro de Citometria de Fluxo
Mais dadosIlustrar a dinamicidade da performance na elegibilidade para tratamento intensivo da leucemia mieloide aguda (LMA) e os desafios impostos pelas limitações terapêuticas do Sistema Único de Saúde (SUS).
Material e métodoRelato de caso com dados de prontuário e discussão baseada em literatura médica.
Descrição do casoPaciente do sexo feminino, 60 anos, diagnosticada com LMA de risco favorável (NPM1 mutado) em dezembro de 2024. Inicialmente inelegível para quimioterapia intensiva devido a obesidade grau 3 e comprometida escala de status de desempenho (ECOG 3), seguiu com tratamento paliativo com citarabina em baixas doses (LDAC 20 mg/m2/dia por 10 dias, em ciclos a cada 28 dias). Manteve estabilidade clínica com a medicação e suporte transfusional até março de 2025, quando houve ascensão leucocitária de 17920/µL para 116200/µL em menos de 3 semanas. Compareceu à unidade de emergência por linfonodomegalia cervical e hipoacusia bilateral, sendo internada por leucostase. Em nova avaliação, evidenciada melhora relativa da capacidade funcional: Índice de Comorbidade de Charlson 4 pontos, Escala de Fragilidade de Edmonton 5 pontos, Escala de desempenho paliativo 70%, ECOG 2. Em virtude desse cenário, após ampla discussão multidisciplinar e concordância com a paciente, prescrita quimioterapia de indução com esquema “3+7”. Houve boa tolerância: evoluiu com intercorrências clínicas esperadas, como neutropenia febril, e recebeu alta pós 35 dias. Diante de avaliação de doença residual mensurável negativa por citometria de fluxo, a paciente seguiu em tratamento de consolidação com altas doses de citarabina. Apresentou recuperação auditiva, resolução de linfonodomegalia e melhora de qualidade de vida.
DiscussãoA LMA é neoplasia com incidência aumentada em pacientes idosos: a mediana de idade ao diagnóstico é de 67 anos. Embora não constitua critério de risco adverso na estratificação da doença, a idade avançada é importante fator prognóstico, tanto pelas alterações citogenéticas e moleculares de maior risco nessa população quanto pelo acúmulo de fragilidade e comorbidades que limitam a tolerância ao tratamento. Diversas ferramentas foram desenvolvidas e validadas para estimar o risco de mortalidade associada ao tratamento intensivo nessa faixa etária; apresentam, contudo, reprodutibilidade limitada e poder preditivo restrito. Quando parte da limitação funcional decorre da própria LMA, critérios fixos de elegibilidade podem subestimar o potencial de recuperação funcional com o controle da doença. Por um lado, a mortalidade de 30 a 50% proveniente da indução intensiva nos pacientes acima de 60 anos, em particular no Sistema Único De Saúde (SUS), limita sua adoção. A LDAC, por sua vez, apresenta taxas de resposta completa de 20%, com mediana de sobrevida global inferior a 6 meses. Estratégias terapêuticas de menor intensidade e maior eficácia - como venetoclax e azacitidina (VIALE-A) - todavia, seguem fora do escopo de cobertura do SUS, perpetuando o dilema clínico na escolha terapêutica.
ConclusãoAs ferramentas atualmente disponíveis para avaliação de eligibilidade de idosos à quimioterapia intensiva na LMA são limitadas e pouco reprodutíveis em cenários de alta mortalidade relacionada à indução, como no SUS, onde há escassez de alternativas eficazes de baixa intensidade. A reavaliação dinâmica da elegibilidade pode, portanto, favorecer a melhor seleção de candidatos à terapia intensiva, mesmo quando inicialmente considerados inaptos.




