
A Síndrome Mielodisplásica (SMD) é caracterizada por hematopoiese clonal e displasia que se traduzem como citopenias no sangue periférico e risco de progressão para Leucemia Mieloide Aguda (LMA). As manifestações clínicas variam conforme a intensidade das citopenias, incluindo fadiga, maior susceptibilidade a infecções e sangramentos. O diagnóstico é definido pela análise histopatológica da medula óssea.
ObjetivoApresentar um caso sobre um paciente adulto, sexo masculino, que provavelmente desenvolveu SMD após história ocupacional de exposição a herbicidas sem utilização de equipamentos de proteção individual (EPI).
Material e MétodosAs informações contidas neste relato de caso foram obtidas a partir de revisão de prontuário, acompanhamento do paciente, dados de exames complementares e revisão de literatura.
ResultadosR.P.M., masculino, 38 anos, referindo astenia progressiva há 3 meses que evoluiu com episódios febris; hemograma evidenciou pancitopenia importante (Hb: 4,2g/dL, Ht: 12,7%, leucometria: 1.990/mm3, neutrófilos: 190/mm3, plaquetas: 17.000/mm3). Ao exame físico, notam-se fácies envelhecida, pele seca e canície. Além disso, palidez cutâneo-mucosa 4+/4+ e baço palpável a 3 cm do rebordo costal esquerdo. Nas histórias patológica pregressa e ocupacional relatava glaucoma bilateral, bem como ter trabalhado durante 12 anos com manuseio de herbicidas (butoxetil 3,5,6-tricloro-2-piridiloxiacetato e ácido 4-amino-3,5,6-tricloropiridina-2-carboxílico) sem uso de EPI. Negava casos de neoplasias hematológicas na família. Esfregaço de sangue periférico apresentava dacriócitos e raros esquizócitos. Aspirado de medula óssea seco e histopatológico compatível com SMD AREB-1 e MF grau 2 com ausência da mutação p. V617F no gene JAK2. O paciente vem sendo tratado com Azacitidina (2 ciclos até o momento); está em fila para transplante de medula óssea com doador aparentado compatível.
DiscussãoA fisiopatologia da SMD está relacionada com mutações nas células-tronco hematopoiéticas, afetando genes como DNMT3A, TET2 e IDH envolvidos nos processos de metilação e demetilação do DNA, entre outros. Sabe-se que a incidência dessas mutações gênicas aumenta com a idade, o que justifica a maior prevalência de SMD na população idosa, com idade média de apresentação aos 70 anos. Como o paciente em questão tem 38 anos e uma forte história ocupacional, foi aventada uma possível relação entre a exposição a herbicidas / pesticidas e a predisposição ao desenvolvimento de SMD. Compostos químicos presentes nas formulações desses produtos parecem lesar o DNA através da superexpressão de espécies reativas de oxigênio (ROS), resultando em mutações genômicas que desencadeariam a doença. Já foi demonstrado que indivíduos com SMD desenvolvida após exposição a agentes mielotóxicos têm um padrão diferente de aberrações cromossômicas e citogenética desfavorável.
ConclusãoA exposição a herbicidas / pesticidas pode induzir mutações gênicas que predispõe ao surgimento de SMD, podendo justificar a patologia em populações mais jovens expostas. Dessa forma, são necessários mais estudos a fim de corroborar essa correlação, além de medidas fiscalizadoras e coercitivas para que se garanta o uso de EPI no trabalho agrícola.