
O tromboembolismo venoso (TEV) é de ocorrência rara na faixa etária pediátrica, sendo na maioria dos casos associado a fatores de risco como a presença de cateter venoso central (CVC). No Brasil os dados sobre TEV pediátrico são escassos.
ObjetivoRealizar um registro prospectivo observacional multicêntrico de pacientes pediátricos hospitalizados com TEV ou com CVC em 6 hospitais do estado de São Paulo.
Material e métodosOs critérios de inclusão foram: diagnóstico de TEV sintomático de qualquer sítio venoso, trombose venosa profunda (TVP) sintomática ou assintomática associada ao CVC e TEV incidental, em crianças hospitalizadas no Boldrini, Hospital de Barretos, Hospital de Clínicas da Unicamp, Hospital das Clinicas da USP de Ribeirão Preto, Hospital das Clínicas da UNESP Botucatu, e Hospital Santa Marcelina. Foram avaliados dados demográficos, quadro clínico e evolução, fatores de risco adquiridos para TEV. Os pacientes com CVC foram investigados quanto a presença de trombose por ultrassom (US). Os pacientes serão acompanhados aos 1, 3 e 6 meses após a alta hospitalar.
ResultadosNo período de 15/04 a 31/07 de 2024, das 2321 internações pediátricas foram elegíveis 234 participantes, e 197 foram incluídos, sendo que 97% relacionado a inserção de CVC. Destes, 51,3% eram do sexo masculino, com mediana de idade 39 meses (0-216). A mediana da internação foi de 16 dias (1-118). Os diagnósticos para internação foram descompensação respiratória (26,9%), cirurgia (22,3%) e quimioterapia (9,1%). Os principais diagnósticos de base foram: doença respiratória (27,9%), câncer (26,4%) e cardiopatia (11,2%). As principais veias de acesso para inserção do CVC foram a veia jugular interna (54,5%) e femoral (14,1%), guiados por US (66,0%) com sucesso na primeira tentativa de punção (66,0%). A maioria dos pacientes utilizou apenas um cateter (69,6%), e o CVC (61,8%) e o PICC (25,1%) foram os mais comuns, com mediana de permanência de 11 dias (1-77). Quanto ao US, 55,5% dos pacientes foram avaliados (N = 106), sendo 60,4% antes da retirada do CVC e 24,5% na alta hospitalar. Foram diagnosticadas 29 TEVs (25,7%), sendo 22 (75,9%) associadas ao CVC. A incidência de TEV em relação ao número de internações foi de 1,25%. Destas, 27,6% foram tromboses sintomáticas e 72,4% assintomáticas associadas ao cateter. A incidência de TEV assintomática nos 106 pacientes com CVC foi 19,8%. Com relação aos fatores de risco para TEV, o CVC representa o maior (75,9%), seguido da doença de base, admissão em UTI e infecção. A terapia antitrombótica não foi realizada na maior parte dos pacientes (51,7%), e nos tratados a heparina fracionada foi o anticoagulante de escolha. Dos 197 pacientes, 121 tiveram alta hospitalar e 10 evoluíram a óbito não relacionado ao TEV.
Discussão e conclusãoA incidência de TEV deste estudo corresponde ao descrito na literatura, sendo compatível a hospitais terciários, e corroborando que o CVC é o maior fator de risco. A busca ativa de TEV justifica a incidência de 19,8%. Praticamente inexistem estudos prospectivos multicêntricos, e esse registro irá contribuir de forma relevante para dados populacionais. Ademais, a discussão sobre o tratamento de tromboses assintomáticas ainda é discutível, e a avaliação longitudinal desses pacientes poderá esclarecer complicações relacionadas às condutas em relação à indicação de anticoagulação.