
A doença falciforme (DF) é uma condição genética frequente no Brasil caracterizada pela presença da hemoglobina S nas hemácias. No início da pandemia do novo coronavírus, houve receio de que pacientes com DF tivessem maior risco de desenvolver doenças mais graves em decorrência dessa infecção viral. Contudo, dados publicados até o momento não apresentam consenso sobre o real impacto da DF na evolução da infecção pelo SARS-CoV-2 e muitos são os questionamentos sobre a prevalência da COVID-19 nesta população. Como essa população é imunossuprimida, a infecção pelo novo coronavírus pode ser uma condição associada a maior morbimortalidade, sendo importante compreender como este vírus pode afetar os pacientes com DF.
Objetivosrelatar os casos clínicos de duas pacientes com DF e COVID-19 atendidas no ambulatório do Hemocentro de Belo Horizonte da Fundação Hemominas.
Material e métodoso diagnóstico da COVID-19 e os dados sobre sua evolução clínica e laboratorial foram acessados por consulta aos relatórios de atendimento ambulatorial. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Fundação Hemominas, CAAE: 36853820.5.0000.5118.
ResultadosCaso 1 – paciente do sexo feminino, 20 anos, homozigota SS, apresentou anemia sendo necessária a realização de transfusão de concentrado de hemácias e suplementação de oxigênio. Não estava em regime de hipertransfusão e não fazia uso de hidroxiuréia. A angiotomografia do tórax revelou trombo em ramo segmentar para lobo médio; derrame plural bilateral, maior à esquerda; e importantes consolidações pulmonares em lobos inferiores. Foi coletado swab da nasofaringe para pesquisa do SARS-CoV-2 e por meio de RT-qPCR foi confirmada a COVID-19. A paciente apresentou melhora clínica e recebeu alta. Caso 2 – paciente do sexo feminino, 61 anos, com hemoglobinopatia SC deu entrada no hospital com dor no corpo e fraqueza. Não estava em regime de hipertransfusão e não fazia uso de hidroxiuréia. Tinha história pregressa de síndrome torácica aguda, retinopatia e hepatite C. Permaneceu internada no hospital para suplementação de oxigênio e tratamento com dexametasona e enoxaparina. Foi coletada amostra de swab da nasofaringe para realização de RT-qPCR para SARS-CoV-2 e o resultado foi positivo. Após 5 dias de internação, a paciente recebeu alta.
DiscussãoDiferente do esperado, as pacientes com DF e infecção pelo SARS-CoV-2 apresentaram evolução clínica favorável, uma vez que nenhuma apresentou quadro clínico grave da COVID-19 e ambas se recuperaram da infecção.
ConclusãoNossos dados sugerem que a DF não aumentou o risco de desenvolver formas graves de COVID-19 nas pacientes. Embora esse achado seja corroborado por relatos de caso em diferentes países, ainda são necessários mais estudos para avaliação dos fatores de maior gravidade pela COVID-19 em pacientes com DF, a fim de reduzir possíveis desfechos desfavoráveis nessa população.