
Relatar um caso de Leucemia Linfoblástica Aguda (LLA) B com t(9;22) durante a 22ª semana de gestação; e o desafio de realizar o tratamento.
Relato de casoPaciente feminino, 30 anos, gestante de 22 semanas foi ao Pronto Atendimento com queixa de astenia. Apresentava anemia (Hb 2,6 g/dL) e leucocitose (18.730 células/μL) com 40% de blastos. A avaliação medular evidenciou infiltração de 95% de blastos, com imunofenótipo positivo para CD19, CD22, CD10, CD34, TdT, HLADR; e negativo para CD20, cadeias leve kappa e lambda, cIgM confirmando o diagnóstico de LLA B comum. A avaliação de líquor mostrou acometimento de sistema nervoso central. Foi discutido com a paciente e esposo sobre opções de tratamento e risco ao feto. Optado por iniciar o ciclo 1 do protocolo HyperCVAD. Após, a medula ainda evidenciava 23,2% de células patológicas. Nesse período, o resultado do cariótipo do diagnóstico foi liberado com a presença da t(9;22)(q34;q11.2) e o PCR foi positivo para BCR-ABL p190 e negativo para BCR-ABL p210. Então, trocou-se o tratamento para Imatinibe 600 mg/dia associado a protocolo de baixa intensidade com 3 ciclos de indução com vincristina 1,4 mg/m2 nos D1 e D14 e Dexametasona 40mg de D1 a D4 e D11 a D14. A paciente foi submetida a cesárea eletiva com 37 semanas gestacionais. Feto nasceu bem, com peso adequado à idade gestacional. Após 3 ciclos de indução, paciente apresentou DRM negativa. Foi realizada consolidação com 6 ciclos, sendo os ímpares com metotrexato 1000mg/m2 no D1; e os pares com citarabina 1000 mg/m2 de 12/12h no D1, D3 e D5. Paciente manteve DRM negativa durante a consolidação. Foram realizadas 15 quimioterapias intratecais, com negativação no líquor a partir do 2º ciclo. Posteriormente, iniciou-se a etapa de manutenção com vincristina 1,4 mg/m2 no D1, prednisona 200 mg de D1 a D5; e Imatinibe 600mg diário, com plano de duração de 11 ciclos. Paciente está em avaliação com equipe do transplante de medula óssea para transplante alogênico aparentado com a irmã. O filho da paciente encontra-se com adequado desenvolvimento neuropsicomotor.
DiscussãoA leucemia aguda é incomum durante a gravidez, afetando aproximadamente 1 em 75.000 a 100.000 gestações, sendo relatada principalmente no segundo e terceiro trimestre3. Somente cerca de 28% dos casos diagnosticados durante a gestação são LLA, sendo mais incomum a presença do cromossomo Philadelphia. Devido a raridade da neoplasia hematológica durante a gravidez, os dados são restritos a estudos retrospectivos e relatos de casos, dificultando a escolha de tratamento. A sintomatologia de leucemia pode ser semelhante aos que já são observados na gestação, como a astenia, dificultando o diagnóstico. A exposição a quimioterápicos citotóxicos durante os segundo e terceiro trimestres predispõe o feto a retardo de crescimento, parto prematuro e supressão medular fetal, portanto a escolha do regime de tratamento é importante. O manejo de cada gestante deve ser individualizado. O parto é preferível entre 32 e 36 semanas de gestação para garantir a maturação fetal ideal.
ConclusãoA leucemia aguda é uma doença rara na gestação, mas quando diagnosticada, deve-se ponderar vários fatores para escolha do tratamento. Neste caso, foi optado por realizar protocolo de quimioterapia de baixa intensidade associada ao Imatinibe apresentando excelente desfecho clínico.