
O rearranjo que acomete o braço curto do cromossomo 8 (8p11) resulta na fusão e amplificação do gene receptor 1 do fator de crescimento do fibroblasto (FGFR1). É uma entidade rara recentemente reclassificada pela World Health Organization (WHO) como Neoplasia Mieloide/Linfoide com Rearranjo FGFR1. Pode se manifestar com diversos fenótipos incluindo neoplasia mieloproliferativa com eosinofilia, leucemia mieloide aguda, leucemia linfoblástica aguda T ou B e/ou a leucemia aguda bifenotípica. As duas alterações citogenéticas mais observadas foram as t(8;22)(p11.2; q11.2;)(BCR) e t(8;13)(p11.2;q12) (ZMYM2). Pacientes com t(8;22) costumam apresentar o quadro de leucemia mieloide crônica (LMC), e de forma mais rara, o de leucemia linfoblástica aguda de células B (LLA-B).
ObjetivosRelatar o caso de um paciente com diagnóstico inicial de leucemia linfoide aguda associada ao rearranjo FGFR1 com posterior mudança de linhagem para leucemia mieloide aguda.
MétodosOs dados foram obtidos através da revisão de prontuário.
Caso clínicoCEDS, masculino, 50 anos, recebeu diagnóstico de leucemia linfoblástica B comum em 10 de fevereiro de 2022. Medula óssea no diagnóstico com 93% de blastos. BCR-ABL p210 e p190 indetectáveis. Cariótipo com resultado 46,XY, t(8;22)(p11.2;q11.2)[10]/46, idem, add (18)(q23)[4]/46,XY[6]. O FISH evidenciou cópia adicional do gene BCR em 79,5% das intérfases analisadas. Paciente foi tratado inicialmente com protocolo CALGB e Rituximab, seguido por Blinatumumab, Inotuzumab, Mini-Hyper-CVD e Dauno-FLAG, após sucessivas recaídas. Após a quinta linha de tratamento, foi submetido ao transplante alogênico de medula óssea. Apresentou nova recaída da doença após 5 meses, com mielograma evidenciando 63% de blastos de características mieloide, confirmando uma leucemia mieloide aguda. Na análise citogenética: 51XY, der(8;22)(q10;q10), +9, +9(del9)(q12)x2, der(11;17)(q10;q10), +12, +13, +19, +21, -22[15]/51,idem,inv(3)(p13q21)[4]/46,XY[1]. Atualmente paciente encontra-se em tratamento com Azacitidina e Venetoclax.
DiscussãoA translocação 8p11.2, que origina a Neoplasia mieloide/linfoide com rearranjo FGFR1, é rara e pouco descrita na literatura. Estudos sugerem uma prevalência em torno de 0,06%. A translocação t(8;22)(p11.2; q11.2;) leva a expressão gênica do BCR-FGFR1, associada de forma rara à leucemia linfoblástica aguda, como do paciente relatado. O mesmo evoluiu com leucemia mieloide aguda após cinco meses de remissão da LLA pós transplante alogênico. Manteve a translocação associado a um cariótipo complexo, como descrito em outros relatos de caso. A possibilidade de mudança de linhagem, como ocorrido, se baseia na teoria da permanência de uma célula progenitora mieloide/linfoide e que pode ser alvo do BCR-FGFR1.
ConclusãoA leucemia linfoblástica aguda de células B causada pelo rearranjo FGFR1 é uma entidade rara e pouco relatada na literatura. A transformação de linhagem para leucemia mieloide aguda pode ser explicada pela teoria da permanência da célula progenitora mieloide que é alvo do BCR-FGFR1.