
Relatar e discutir o caso de intensa leucocitose durante o curso da coinfecção pelos vírus Epstein-Barr (EBV) e Rotavírus (RV), acompanhado na unidade hospitalar Beneficência Portuguesa do Grupo Fleury.
Materiais e métodosForam avaliados os resultados dos exames de hemograma e bioquímica realizados no período de jul/2024.
ResultadosIndivíduo do sexo masculino, 1 ano e 6 meses, deu entrada no Pronto Atendimento infantil apresentando febre e diarreia. Observou-se no hemograma, intensa leucocitose (67.090/mm3) com alta contagem de linfócitos (49.160/mm3), sendo 80% reativos. As séries, vermelha e plaquetária não exibiram alterações significativas. Nos exames bioquímicos, observaram-se alterações nos marcadores enzimáticos e na dosagem de eletrólitos. As enzimas hepáticas e a Proteína C reativa mostraram-se ligeiramente elevadas, assim como os íons potássio e cálcio, enquanto sódio, magnésio e fósforo apresentaram ligeira diminuição (AST: 99 U/L; ALT: 44 U/L; DHL: 703 U/L; GGT: 172 U/L; CA++: 1,46 mmol/L; Mg+: 1,5 mg/dL; K+: 5,6 mEq/L; Na+: 135 mEq/L; PCR: 1,24 mg/dL). O paciente realizou exames complementares, sorologias e detecção de RV nas fezes. A sorologia resultou positiva para EBV e a pesquisa para RV também apresentou resultado positivo.
DiscussãoLinfócitos reativos são mais comumente associados a infecções virais. Eles possuem características morfológicas distintivas dos linfócitos normais, como pleomorfismo celular, basofilia e cromatina intermediária. Algumas viroses, como a mononucleose infecciosa, são conhecidas por apresentarem alta reatividade linfocitária. O patógeno responsável pela mononucleose infecciosa, popularmente conhecida como “doença do beijo”, é o EBV. Pertencente à família Herpesviridae e ao gênero Lymphocryptovirus, seu genoma é constituído por DNA de fita dupla (dsDNA), possui capsídeo icosaédrico e envelope lipídico. Seu ciclo infeccioso apresenta estados latentes e líticos, e, além da mononucleose, a infecção por EBV está associada a uma síndrome rara conhecida como linfohistiocitose hemofagocítica (EBV-HLH). O RV, é um dos principais causadores de gastroenterites infecciosas agudas. Pertencente à família Reoviridae e estruturalmente um vírus não envolto de simetria icosaédrica, seu genoma é constituído por fita dupla de RNA (dsRNA), e infecta os enterócitos, causando danos ao citoesqueleto celular. Durante o curso desta incomum coinfecção, foram observadas alterações bioquímicas, incluindo elevação nas enzimas hepáticas comuns na infecção por EBV, combinadas com o distúrbio eletrolítico causado pela desidratação derivada da infecção por RV. O mecanismo imunológico relacionado à intensa leucocitose com linfócitos reativos envolve respostas celulares e citocinas específicas (INF-γ, IL-6, IL-10 e TNF-α).
ConclusãoA coinfecção por EBV e RV é incomum, embora já tenha sido relatada na literatura. As manifestações clínicas são variadas devido à complexa interação entre os vírus e o sistema imune do hospedeiro, como a intensa leucocitose observada neste caso. A presença de linfócitos reativos e a confirmação sorológica e antigênica foram fundamentais para o manejo adequado do paciente, destacando a importância de um diagnóstico diferencial preciso.