
As neoplasias mieloides com predisposição germinativa foram incluídas como uma nova entidade clínica pela Organização Mundial de Saúde em 2016. A predisposição genética para LMA associada a mutação germinativa do CEBPA é de herança autossômica dominante, sendo todas variantes germinativas do tipo frameshift e na porção N-terminal. A detecção de neoplasia mieloide com predisposição germinativa é crucial visto as implicações relacionadas ao tratamento quimioterápico, seleção de doador para Transplante de Medula Óssea (TMO), seguimento clínico e aconselhamento genético. Neste trabalho, descrevemos uma nova variante germinativa em CEBPA em uma família com LMA com predisposição germinativa.
Materiais e métodosFoi realizada análise retrospectiva de dados clínicos. Amostra de medula óssea da paciente foi submetida a sequenciamento de exoma diante do histórico familiar de LMA. Os parentes foram submetidos a sequenciamento por Sanger para detecção da variante germinativa encontrada.
ResultadosMenina, 6 anos, há 1 semana com pancitopenia e visualização de blastos em sangue periférico. Foi realizado mielograma que evidenciou 67% de blastos e análise imunofenotíca que confirmou o diagnóstico de LMA. Diante do histórico familiar de cinco parentes por parte de mãe falecidos por LMA, foi realizado exoma da paciente, com identificação de duas variantes patogênicas: 1) NM_004364.4, c.354_355dup (p.Val119Alafs*42), no gene CEBPA, em heterozigose (Zigosidade: 45%) e 2) NM_004364.4, c.934_936dup (p.Gln312sup) no gene CEBPA (exon 1), em heterozigose (Zigosidade: 38%). Amostras de saliva coletadas da mãe, irmã e dois tios maternos foram submetidas ao sequenciamento por Sanger, sendo identificada a variante NM_004364.4, c.354_355dup (p.Val119Alafs*42) em heterozigose em todos os familiares. A paciente foi tratada com quimioterapia convencional, atingindo Remissão Completa (RC) com doença residual mínima (DRM) por citometria de fluxo negativa após a primeira consolidação, sendo optado por seguimento clínico.
DiscussãoAmaioria das LMAs ocorre de forma esporádica; contudo, estimativas atuais sugerem que até 13% das LMAs possuem predisposição germinativa, com destaque para mutações envolvendo os genes DDX41 e RUNX1. LMA com mutação germinativa em CEBPA é uma doença rara. Dados da maior coorte descrita, englobando dados clínicos de 10 famílias, demonstram que os indivíduos afetados possuem uma alta taxa de evolução para LMA, superior a 50% em 10 anos, resposta favorável à quimioterapia convencional, com sobrevida global em 10 anos maior que 60%, inclusive nos casos de recaída, cuja mediana de sobrevida global foi de 8 anos. O caso demonstrado apresentou RC e DRM negativa após tratamento convencional, corroborando o prognóstico favorável descrito na literatura. O TMO pode ser utilizado como tratamento de consolidação naqueles pacientes com DRM positiva ou com alto risco citogenético, sendo os melhores resultados obtidos com doadores alogênicos aparentados compatíveis 10/10. Apesar do TMO não ser considerado parte do tratamento de primeira linha nesta paciente, o sequenciamento dos familiares foi determinante, visto que a irmã, apesar de ser HLA idêntica, possui a mesma variante em heterozigose e, portanto, não é elegível como potencial doador.
ConclusãoEm resumo, este caso reporta uma mutação germinativa ainda não descrita na literatura e exemplifica que a identificação de variantes germinativas é essencial para a condução terapêutica de LMAs.