
A Hemofilia A adquirida é uma desordem hemorrágica autoimune mediada por autoanticorpos contra o fator VIII da coagulação, que acomete predominantemente idosos e mulheres no pós-parto, com incidência de cerca de 1,5 indivíduos por milhão. Por ser uma doença rara potencialmente fatal e pouco conhecida pelos clínicos, é muito subdiagnosticada, levando a uma taxa de mortalidade entre 15%‒42%, o que demonstra a importância de se relatar esse caso.
RelatoPaciente masculino, 83 anos, branco, hipertenso, apresentava equimoses extensas e hematomas subcutâneos, espontâneos, sem história pessoal ou familiar de doenças hemorrágicas. O exame físico revelava palidez cutâneo mucosa, grandes equimoses em membros, dorso e abdômen, além de hematoma subcutâneo em região cervical. O hemograma evidenciava anemia, acompanhada de contagem de leucócitos e plaquetas normais. O Tempo de Tromboplastina Parcial ativada (TTPa) mostrava-se acentuadamente prolongado de 90,4s e não corrigia com o teste da mistura. A dosagem de fator VIII foi de 0,4% e do título de inibidor do fator VIII de 104 unidades Bethesda, resultados consistentes com o diagnóstico de Hemofilia A adquirida. Como o paciente se encontrava sem sangramento ativo, não necessitou de agente de by-pass, sendo iniciada prednisona (1 g/Kg/dia) associada a ciclofosfamida (1 mg/Kg/dia). Após 7 semanas de tratamento, o nível de fator VIII aumentou para 249%, com pesquisa de inibidor negativa, e o paciente não apresentou novos sangramentos.
DiscussãoO diagnóstico rápido da Hemofilia A adquirida é de fundamental importância, já que reduz significativamente sua morbimortalidade. Os testes de coagulação, que devem ser solicitados nesse cenário, geralmente mostram um TTPa prolongado, com TAP normal e, a confirmação do diagnóstico, requer a realização de exames especializados que incluem o teste da mistura, a dosagem do fator VIII, da atividade do fator de von Willebrand e a detecção e dosagem do título do inibidor. Todos os pacientes diagnosticados com a doença necessitam de tratamento independentemente da presença de sangramento ativo no momento do diagnóstico. A terapia inclui a erradicação do autoanticorpo inibidor do fator VIII através de terapia imunossupressora, com a utilização de medicamentos como corticosteroides, ciclofosfamida e rituximabe; o tratamento da doença subjacente, se presente e o controle e a prevenção de sangramentos, através da administração de agentes de by-pass, como o fator VII ativado e o complexo protrombínico parcialmente ativado.
ConclusãoDiante do exposto, o reconhecimento precoce da Hemofilia A adquirida é fundamental, permitindo o tratamento adequado e a redução do risco de sangramentos espontâneos e fatais.