
A leucemia mieloide aguda (LMA) possui grande heterogeneidade genética e difícil tratamento, sendo um desafio em oncologia. Frequentemente são observadas mutações no gene FLT3 (fms-like tyrosine kinase 3), que codifica um receptor tirosina quinase muito importante nos processos iniciais da hematopoiese e cuja ativação regula vários processos celulares, como transcrição, proliferação e apoptose. Dois tipos de mutação são comuns nesse gene: a duplicação interna in tandem no domínio justamembrana (FLT3-ITD) e as mutações pontuais nos resíduos D835/I836 do domínio tirosina quinase (FLT3-TKD). Como consequência da ativação constitutiva do receptor FLT3, há maior estímulo à proliferação de clones leucêmicos. Além disso, estudos demonstram que a superexpressão de FLT3 está associada a um pior prognóstico em pacientes com LMA. Há evidências de que este desfecho possa ocorrer independentemente da presença de mutações ativadoras, entretanto, ainda há pouca elucidação sobre o assunto. Com isso, buscamos determinar o nível de expressão gênica associado ao estado de ativação oncogênica de FLT3 em pacientes com LMA.
MetodologiaPara tal, amostras de pacientes diagnosticados com LMA estão sendo recebidas de diferentes centros: Prontobaby, IMIP, IPPMG-UFRJ, Hemorio e Hospital Amaral Carvalho. Além disso, as amostras estão sendo caracterizadas quanto à ocorrência das principais alterações de risco prognóstico definidas pela European LeukemiaNet (ELN): mutações em FLT3 (ITD e TKD), NPM1 e WT1. A busca por mutações em FLT3-ITD e NPM1 está sendo realizada por análise de fragmentos, enquanto a busca por mutações FLT3-TKD e no gene WT1 está sendo realizada por sequenciamento de Sanger. Por fim, para verificar a associação entre o nível de expressão de FLT3 com marcadores de ativação desta via, dados de expressão gênica (RNA-seq) e proteica (RPPA) foram obtidos do banco de dados CCLE. Posteriormente foi realizada uma análise de expressão diferencial entre dois grupos de linhagens celulares de LMA: com mutação em FLT3 vs. com baixa expressão de FLT3.
ResultadosAté o momento, incluímos 63 amostras, sendo que a maior parte dos pacientes é do sexo masculino (51%) e com a mediana de idade de 12 anos (variação: 0-79 anos); o subtipo FAB M3 representa 13% dos casos. Do ponto de vista molecular, 14% dos pacientes possuem alteração no gene NPM1, 13% em FLT3-ITD, 1,26% em FLT3-TKD e nenhum paciente apresentou alteração no gene WT1. Seguindo a estratificação de risco prognóstico definida pela ELN, 8 pacientes foram classificados com prognóstico favorável, 6 com intermediário e 2 com prognóstico desfavorável. Nas abordagens in silico, destacam-se três genes diferencialmente expressos entre os dois grupos de linhagem celular: BCL2, STAT5 e NDRG1. Eles apresentaram expressão proporcional à observada em FLT3 (R = 0,62 p = 0,00016; R = 0,62 p = 0,00016; R = 0,7 p = 7,7e-06, respectivamente). Além disso, seus níveis transcricionais foram diretamente proporcionais aos seus níveis proteicos (R = 0,19 p = 6,2e-12; R = 0,9 p = 1,5e-12; R = 0,61 p = 0,00018, respectivamente).
Conclusões e perspectivasA partir disso, esperamos utilizar estes marcadores para entender melhor os mecanismos de ativação oncogênica de FLT3 na LMA, o que é essencial para melhorar a estratificação de risco prognóstico desses pacientes, além de auxiliar no desenvolvimento de novas terapias para a doença.