
Apesar dos avanços das terapias-alvo nas últimas décadas, o tratamento da Leucemia Linfocítica Crônica (LLC) recaída/refratária no Brasil continua sendo um desafio significativo, especialmente no contexto do sistema de saúde pública. Embora as diretrizes recomendem o uso dessas terapias devido ao seu perfil de efeitos adversos e eficácia comprovada, as barreiras de acesso persistem, afetando negativamente os desfechos dessa população.
ObjetivoDescrever os tratamentos de segunda linha para pacientes com LLC acompanhados em um hospital público brasileiro.
MétodoEstudo observacional retrospectivo de tratamentos de segunda linha para LLC iniciados entre junho de 2008 e dezembro de 2023.
Resultados/DiscussãoForam incluídos 98 pacientes com LLC que receberam terapia em segunda linha. A mediana de idade foi de 48 anos (intervalo: 35-86) e 50 pacientes eram do sexo masculino (51%). A mediana de seguimento foi de 179 meses (21-300). Em relação ao status funcional, 49 pacientes apresentavam ECOG 0, 34 ECOG 1 e 14 ECOG 2 ou superior. No momento do diagnóstico de LLC, 32 pacientes foram classificados como estágio A de Binet (32%), 40 como estágio B (40%) e 28 como estágio C (28%). Níveis elevados de beta-2-microglobulina foram detectados em 57 pacientes (74% dos pacientes testados), e a mutação não mutada de IGHV foi observada em 8 pacientes (66% dos pacientes testados). O FISH foi realizado em 35 pacientes (35%), dos quais 2 apresentaram del(17p) (6%). A pesquisa de mutação do TP53 foi realizada em 7 pacientes (7%) e nenhum apresentava a alteração. Os tratamentos de segunda linha mais prescritos foram: Clorambucil (± R) em 31 pacientes (31%); FC (± R) em 27 (27%); CHOP/CVP (± R) em 24 (24%); ibrutinibe em 4 (4%); anticorpos monoclonais (± esteróides) em 7 (7%); venetoclax em 3 (3%) e acalabrutinibe em 1 (1%). Um total de 45 pacientes (45%) recebeu tratamento com anticorpos monoclonais em combinação com outros regimes. Três pacientes (3%) participaram de ensaios clínicos. Em termos de resposta ao tratamento, 14 pacientes (14%) alcançaram resposta completa, 34 (34%) resposta parcial, e 36 (36%) mostraram doença estável ou em progressão. Quarenta e seis pacientes foram submetidos a tratamentos subsequentes. Cinquenta pacientes faleceram durante o acompanhamento. Esta população apresentou uma mediana de idade inferior às descritas na literatura e limitações na disponibilidade de ferramentas para estratificação prognóstica. A maioria dos pacientes recebeu quimioimunoterapia, que pode ser inadequada neste contexto, com poucos pacientes participando de estudos clínicos.
ConclusãoEstratégias para superar as limitações dos serviços públicos no tratamento da LLC recaída/refratária necessitam de atenção criteriosa. Iniciativas promissoras incluem a adoção de uma postura mais conservadora na indicação de tratamento, visando evitar intervenções desnecessárias, toxicidade associada e óbitos evitáveis, maior participação em ensaios clínicos, quando disponíveis, e buscar ativamente pela inclusão de novos tratamentos no Sistema Único de Saúde (SUS).