
O tratamento de Neoplasias Hematológicas (NH) possui na sepse complicação frequente e com alta letalidade. Nestes pacientes, a ocorrência de neutropenia febril pode atingir até 40% e seu reconhecimento tardio, manejo inadequado ou sem possibilidade de reconhecimento de foco ou agente infeccioso compromete a continuidade do tratamento e a sobrevida dos pacientes.
ObjetivoAvaliar a positividade de hemoculturas em pacientes internados com NH, com e sem neutropenia febril, e seu impacto no escalonamento ou desescalonamento antimicrobiano, e na sobrevida destes pacientes.
MétodosRevisão de prontuários eletrônicos de pacientes internados com NH, em um hospital terciário, no período de 2019 e 2020. Os dados analisados foram sexo, idade, diagnóstico e tratamento hematológico, motivo e tempo de internação, antibióticos administrados, data e números de hemoculturas coletadas, uso de inibidor enzimático, tempo até positividade, perfil microbiológico e de resistência, e se houve mudança da antibioticoterapia após resultado da hemocultura e desfechos clínicos. O trabalho foi aprovado pelo comitê de ética institucional.
ResultadosForam incluídos 216 pacientes, com média de 63 anos de idade (intervalo interquartil: 49‒71), e 59% do sexo masculino. Observou-se mediana de 2 internações por paciente, com mediana de duração de 14 dias. O principal diagnóstico foi linfoma (29%), seguido de leucemia aguda (25%) e mieloma múltiplo (20%). Foram coletadas 560 hemoculturas, com 17% positivas. Entre as hemoculturas positivas (n=94), 43% possuíam perfil incompleto de sensibilidade e 22% tiveram mudança de antimicrobiano guiada pela hemocultura. Neutropenia febril foi o contexto em 290 coletas (52%), com 83% dos pacientes (n=241) já em uso de antibioticoterapia de amplo espectro. Dentre os principais patógenos identificados, 51% eram gram positivos e Klebsiella pneumoniae foi o agente infeccioso (16%) mais comum. Foram observados 126 óbitos intra-hospitalares, sendo que 74 ocorreram devido a sepse (59%). Entre os óbitos por sepse, 49 dos pacientes apresentavam diagnóstico recente de NH (66%) e 16 apresentavam doença recidivada ou refratária (22%).
DiscussãoSepse é uma das principais causas de morbidade e mortalidade em pacientes com NH, sobretudo no contexto de neutropenia febril. Em nosso cenário, a baixa positividade de hemocultura com limitada influência em guiar terapia antimicrobiana pode ter influenciado negativamente na mortalidade. Tanto o escalonamento baseado em cultura, quanto a restrição de antibiótico de amplo espectro são parte essencial para combater infecções multirresistentes, reduzir mortalidade em pacientes vulneráveis e melhor economia em saúde na gestão hospitalar. A maior parte dos pacientes com óbito por sepse nesta população não pode obter o controle da NH ou estava em remissão, o que é alarmante entre os desfechos observados. Esta população vulnerável à sepse pelo diagnóstico de NH ou seu tratamento demanda decisões acertadas e em tempo hábil para mudança dos desfechos observados.
ConclusãoA observação de 1 hemocultura positiva em cada 6, e 1 mudança de conduta a cada 5 hemoculturas positivas demonstra a necessidade de melhor manejo de infecção hospitalar em pacientes com NH em nosso meio.