
a Síndrome de Blue Rubber Bleb Nevus é rara, com aproximadamente 200 casos relatados na literatura, e cursa com anomalias vasculares que consistem em má formações venosas multifocais envolvendo pele, sistema nervoso central, fígado, músculos e/ou trato gastrointestinal (TGI). Isto gera, especialmente quando acomete o TGI, sangramentos crônicos e intermitentes com anemia ferropriva de intensidades variáveis. O diagnóstico envolve exames de imagem como endoscopia digestiva alta (EDA), colonoscopia e, quando acomete intestino delgado, cápsula endoscópica, como no caso a seguir.
Relato de casoHomem, 65 anos, procurou o ambulatório de Hematologia da UNIFAL após dez anos de episódios de anemia ferropriva recorrentes com cinco EDAs e quatro colonoscopias normais ao longo dos anos anteriores. Paciente não adepto à terapia transfusional por questões religiosas, teve pelo menos três internações graves em UTI para controle do sangramento intestinal com ácido tranexâmico e terapia de suplementação de suporte com ferro, cobalamina, eritropoetina e ácido fólico. Paciente funcional, hipertenso e com Hashimoto compensados, em uso de levotiroxina e losartana. Ao exame físico, tinha palidez cutâneo-mucosa e nevus em lábio inferior com 0,6 cm. Na ocasião, a hemoglobina estava 8,9 g/dL com VCM 80,5 sem outras citopenias; ferritina sérica de 4,8 ng/mL, sangue oculto nas fezes positivo. Diante de tantas EDAs e colonoscopias normais, solicitamos, então, cápsula endoscópica para identificação do local de sangramento intestinal. O paciente realizou o exame sem intercorrências com identificação de diversas lesões venosas de jejuno, azuladas e arroxeadas, algumas elevadas, sugestivas da síndrome em questão. Segue em tratamento de suporte para controle da anemia e aguarda liberação judicial de sirolimus e talidomida para tentativa de redução de angiogênese.
DiscussãoNosso paciente tem somente um foco identificado de nevus em lábio inferior, sem lesões aparentes nas imagens tomográficas de crânio e tórax, sem manifestações clínicas hemorrágicas em outros locais. Na presença de hemorragia digestiva com EDA e colonoscopia sem alterações, segundo guideline recente publicado no NEJM, o exame de escolha é a cápsula endoscópica. Justamente por este exame conseguimos fechar o diagnóstico definitivo do paciente em questão. As opções terapêuticas para esta síndrome vascular descritas na literatura são escassas, até pelo número reduzido de casos descritos. Artigos de revisão e relatos de caso trazem sirolimus, talidomida, ressecção cirúrgica ou fotocoagulação quando as lesões são mais limitadas. Como nosso paciente tem múltiplas lesões jejunais, solicitamos os medicamentos sistêmicos e aguardamos liberação judicial.
ConclusãoInvestigar a fundo a etiologia da anemia ferropriva nos permite ampliar as possibilidades diagnósticas e ofertar a terapêutica correta e efetiva ao paciente que nos procura.