
Mutações no gene FLT3 atingem cerca de 30% dos pacientes com leucemia mieloide aguda (LMA), sendo a FLT3-ITD a mais frequente e relacionada a pior prognóstico. O desenvolvimento de inibidores de FLT3 representou um avanço no tratamento da LMA, pois reduzem a proliferação celular e melhoram a sobrevida dos pacientes. Contudo, a limitação clínica no tratamento com essas drogas representa uma oportunidade de investigar combinações de fármacos que resultem em melhores resultados terapêuticos.
ObjetivosO presente estudo tem como objetivo verificar se inibidores de FLT3 induzem autofagia e se a inibição deste processo potencializa seu efeito anti-leucêmico.
Materiais e métodosA linhagem celular MOLM-13, portadora da mutação FLT3-ITD, foi submetida ao tratamento com os fármacos inibidores de tirosinoquinase midostaurina (3.125-100 nM) e quizartinibe (0.625-20 nM) por 48 horas para acessar a viabilidade e sobrevivência das células. Após isso, as células foram tratadas com midostaurina a 6.25, 12.5 e 25 nM e quizartinibe a 0.625, 1.25 e 2.5 nM e posteriormente analisadas quanto ao surgimento de autofagia através da detecção da sonda celular de livre-permeabilização laranja de acridina em citometria de fluxo. Após isso, as células foram tratadas com os inibidores de FLT3 associados à cloroquina (5 e 10 μM) ou bafilomicina (2.5 e 5 nM), ambos inibidores de autofagia, com posterior análise de viabilidade celular utilizando metiltiazoltetrazólio (MTT) e mensuração de absorbância.
ResultadosA concentração inibitória média (IC50) para o tratamento com midostaurina e quizartinibe em células MOLM-13 foi de 25.5 nM e 1.8 nM, respectivamente. O tratamento com midostaurina e quizartinibe induziu a autofagia, fato evidenciado pelo aumento da formação de organelas vesiculares ácidas (AVO): 9% veículo; 30% e 41% para midostaurina a 12.5 e 25 nM, respectivamente; 42% e 40% para quizartinibe a 1.25 e 2.5 nM, respectivamente (p≤0,05). O tratamento com midostaurina (6.25, 12.5 e 25 nM) ou quizartinibe (0.625, 1.25 e 2.5 nM) combinados à cloroquina nas doses de 5 μM ou 10 μM reduziu a viabilidade celular em pelo menos 40% comparado ao uso dos inibidores tirosinoquinase de maneira isolada (p≤0,0001). O tratamento com midostaurina (6.25, 12.5 e 25 nM) associado à bafilomicina a 2.5 nM ou 5 nM, por sua vez, alcançou pelo menos 60% de redução na viabilidade celular (p≤0,0001). Similarmente, o tratamento com quizartinibe (0.625, 1.25 e 2.5 nM) combinado à bafilomicina culminou na redução em pelo menos 50% da viabilidade celular comparado à monoterapia com o inibidor de FLT3 (p ≤ 0,001).
DiscussãoOs resultados sugerem que o aumento do fluxo autofágico consequente da terapia com inibidores de FLT3 é um mecanismo que limita a eficácia terapêutica dessas drogas, e que a terapia combinada com inibidores de autofagia pode revelar-se uma estratégia promissora, além de contribuir para a elucidação de mecanismos de resistência adquiridos por células leucêmicas aos inibidores de FLT3. Estes achados serão complementados com estudos de apoptose e proliferação celular, bem como em modelo animal de xenoenxerto.
ConclusãoPode-se concluir, portanto, que os inibidores da atividade tirosinoquinase de FLT3, midostaurina e quizartinibe, induzem a autofagia e seu efeito anti-neoplásico é potencializado pela inibição farmacológica do processo autofágico.