A Doença de Chagas é uma doença tropical negligenciada, de expressiva morbimortalidade e elevada prevalência. Apresenta duas fases clínicas distintas: a aguda e a crônica, esta última podendo manifestar-se nas formas indeterminada, cardíaca, digestiva ou cardiodigestiva. Nos últimos 15 anos evidencia-se a ocorrência sistemática de casos agudos relacionados à transmissão oral pela ingestão de alimentos contaminados, principalmente na região amazônica, bem como à transmissão vetorial extradomiciliar, com a exposição acidental ao ciclo silvestre do agente etiológico.

Descrever a prevalência da infecção pelo Trypanosoma cruzi  entre os doadores de sangue do Instituto de Hematologia e Hemoterapia do Amapá.

É um estudo do tipo observacional retrospectivo. A coleta dos dados foi realizada através do HEMOVIDA (Sistema Nacional de Gerenciamento em Serviços de Hemoterapia) no período de janeiro de 2020 a julho de 2022. Os métodos utilizados para a triagem sorológica foi a Quimioluminescência e Eletroquimioluminescência e como teste confirmatório foi realizada a Imunofluorescência Indireta pelo Laboratório Central de Saúde Pública do Amapá.

No período analisado, houveram 34.424 doadores aptos a realizar a doação de sangue no Instituto de Hematologia e Hemoterapia do Amapá, destes 38 (0,11%) apresentaram sorologia reagente ou inconclusiva para Doença de Chagas pela Quimoluminescência e Eletroquimioluminescência. Destes 27 (0,08%) foram reagentes e 11 (0,031%) foram inconclusivas. Dentre os 38 doadores com sorologia alterada, 22 (0,06%) tiveram o diagnóstico sorológico confirmado pela Imunofluorescência Indireta e foram encaminhados para o Centro de Referência de Doenças Tropicais para iniciar o monitoramento. Com relação ao gênero dos doadores com resultados reagentes ou inconclusivos, 39% eram mulheres e 61% homens com idade variando entre 24 e 60 anos, com média de 39 anos. Em relação a cidade de residência 89% eram de Macapá e 11% da cidade de Santana.

Como consequência das elevadas incidências ao longo do século XX, estima-se que haja no Brasil, atualmente, pelo menos um milhão de pessoas infectadas pelo Trypanosoma cruzi. Conforme estimativa de que 60% das pessoas com infecção por T. cruzi permanecem na forma indeterminada, e de que 30% e 10% evoluirão para forma cardíaca e digestiva, respectivamente, existiriam em 2020, considerando as projeções das estimativas de prevalência de infecção por T. cruzi de 1,02% ou 2,4% no Brasil. A ausência de sintomas clínicos na maioria dos infectados justifica a importância da triagem sorológica em Bancos de Sangue, visto que a transfusão sanguínea é uma das vias de transmissão dessa infecção.

Apesar da prevalência da Doença de Chagas ser menor em comparação com diversas outras infecções transmitidas pelo sangue, conhecer o perfil do doador inapto é importante para a garantia da prática hemoterápica segura, principalmente pela característica endêmica dessa infecção no Estado do Amapá caracterizada por períodos de surtos associados a alimentos contaminados.