HEMO 2025 / III Simpósio Brasileiro de Citometria de Fluxo
Mais dadosOs primeiros 1.000 dias de vida, do período fetal aos primeiros 2 anos, constituem uma janela crítica para o desenvolvimento cerebral, sendo a atuação do ferro essencial na mielinização, na síntese de neurotransmissores e no metabolismo energético. Em muitos casos a Deficiência de Ferro (DF) é considerada grave quando caracterizada pelo quadro de anemia, entretanto, já existem evidências que a DF afeta a função cerebral muito antes do aparecimento dos sintomas anêmicos. Portanto, são essenciais a prevenção, o rastreamento e o tratamento da DF não anêmica e pré-anêmica para a proteção do cérebro.
ObjetivosO presente estudo tem como objetivo revisar e sintetizar as evidências científicas sobre a deficiência de ferro subclínica nos primeiros 1000 dias de vida, explorando seus determinantes e abordando as consequências duradouras para o desenvolvimento neurológico infantil.
Material e métodosA pesquisa foi estruturada pela estratégia PICO: População, Intervenção, Efeito Comparador e Desfechos (outcomes), respectivamente: crianças nos primeiros 1000 dias de vida, deficiência de ferro subclínica, crianças sem deficiência de ferro e/ou desenvolvimento adequado e impactos no neurodesenvolvimento infantil. Foi conduzida uma revisão integrativa nas bases PubMed e UpToDate utilizando os descritores “iron deficiency”, “subclinical iron deficiency”, “first 1000 days” e “neurodevelopment” combinados por operadores booleanos OR e AND. Os critérios de inclusão foram artigos originais e de revisão publicados entre 2020 e 2025, em inglês ou português, sobre a deficiência de ferro subclínica nos primeiros 1000 dias e repercussões no neurodesenvolvimento infantil. Excluíram-se estudos com foco exclusivo em anemia, em adultos ou em modelos animais. Após a aplicação da estratégia de pesquisa foram 33 estudos identificados, 26 classificados como potencialmente relevantes e 11 escolhidos após a 2ª análise. A seleção dos dados foi realizada de forma independente por quatro revisores.
Discussão e conclusãoDentre os 11 estudos captados, a DF nos primeiros mil dias mostrou prevalências de 30%‒60%. Em 60% dos estudos feitos em diversos países, a ferritina materna indicou melhor neurodesenvolvimento nos filhos de mães com bom status de ferro conforme testes padronizados de funcionamento neural. Ainda, observou-se que 40%‒60% dos recém-natos de mães anêmicas por DF tinham reservas prejudicadas, mesmo sem clínica. A ferritina < 13,4 μg/L foi considerada limiar crítico para as reservas fetais, impactando na disponibilidade de ferro para o desenvolvimento cerebral. Ensaios clínicos mostraram que o clampeamento tardio (≥ 180s) reduziu atrasos em motricidade fina (11,0% para 3,7%) e em tarefa motora (12,9% para 3,8%) em meninos aos 4-anos; em meninas, reduziu o risco de atraso motor aos 3-anos. Em prematuros, a DF associou-se a déficits motores, de memória e de desenvolvimento, muitos não revertidos com suplementação. Apesar da conhecida importância do ferro, há divergências quanto à eficácia da suplementação profilática, possivelmente pela desconformidade amostral, já que a medida parece impactar mais grupos sem um bom status nutricional. Como o ferro é destinado primeiramente à síntese de hemoglobina, antes do cérebro e dos demais órgãos, sua depleção leva a prejuízos cerebrais antes de surgir o quadro anêmico. Assim, é imperativo rastrear as DFs precocemente, integrando a políticas públicas de saúde, para minimizar os déficits de neurodesenvolvimento decorrentes da deficiência, mesmo que subclínica, do micronutriente.




