HEMO 2025 / III Simpósio Brasileiro de Citometria de Fluxo
Mais dadosA Leucemia Transitória associada à Síndrome de Down (LT-SD) é uma neoplasia mieloproliferativa de mielopoiese anormal que acomete cerca de 10% dos neonatos com trissomia completa ou mosaicismo do cromossomo 21. Embora sua apresentação clínica possa mimetizar a de leucemias agudas, a LT-SD se diferencia pelo seu curso autolimitado, com regressão em semanas ou meses. No presente relato, destaca-se a remissão espontânea da LT-SD em um neonato com cardiopatia congênita complexa e instabilidade hemodinâmica, o que evidencia a possibilidade de evolução favorável mesmo diante de quadros graves.
Descrição do casoNeonato com peso de 3.440g, nascido de cesariana eletiva a termo e filho de mãe hígida. Apresenta cariótipo confirmado para síndrome de Down e diagnóstico de tetralogia de Fallot de má anatomia, caracterizada por comunicação interventricular ampla, hipoplasia e atresia dos ramos pulmonares, canal arterial tortuoso e valva aórtica ectasiada. Após o nascimento, manifestou cianose grave, exigindo reanimação com intubação orotraqueal e suporte ventilatório em Unidade de Terapia Intensiva Neonatal. Nas horas subsequentes, evoluiu com choque hipovolêmico sem resposta à expansão, sendo instalado suporte Venoarterial com Oxigenação por Membrana Extracorpórea (ECMO-VA) por canulação cervical, intensificada terapia medicamentosa e realizadas expansões com plasma e com albumina. Contudo, seguiu instável hemodinamicamente. Em exames com menos de 24 horas de vida, apresentou eritropenia (hemácias 2,52 × 10⁶ μL), macrocitose (VCM 120 fL), plaquetopenia (20.000 μL), leucocitose (83.790 μL), 8% de eritroblastos, anisocitose e policromasia. Evidenciou-se também 75% (62.843 μL) de blastos, sendo levantada suspeita de LT-SD, a qual foi confirmada pela imunofenotipagem do sangue periférico posteriormente. No segundo dia de vida, ocorreu reversão da eritropenia (hemácias 3,85 × 10⁶/μL) e da macrocitose (VCM 95 fL), além de redução da leucocitose para 40.280 μL, acompanhada por 82% (33.030 μL) de blastos. Com cinco dias, foi submetido à cirurgia para correção da cardiopatia congênita, necessitando de infusão de concentrados de hemácias e de plaquetas para manejo de anemia e plaquetopenia. Do sexto ao décimo dia, notou-se melhora progressiva dos parâmetros hematológicos, com queda da leucocitose para 21.630 μL e redução da blastemia para 11% (670 μL), sem terapêutica específica para LT-SD. Em vista da melhora clínica, procedeu-se à retirada do ECMO-VA. No início da terceira semana de vida, observou-se contagem de blastos de 1% (46 μL) e de leucócitos de 4.610/μL. Ao final dessa mesma semana, constatou-se remissão completa do quadro de disfunção hematológica, com exames demonstrando hemoglobina 13,8 g/dL, hematócrito 43,7% e plaquetas 380.000 μL. Diante da estabilidade clínica e laboratorial, o paciente recebeu alta da hemodinâmica, sendo encaminhado à enfermaria na quinta semana.
ConclusãoA evolução favorável, com remissão espontânea da LT-SD em um curto intervalo de tempo, ressalta não apenas o caráter autolimitado da condição, mas também a importância de uma condução clínica multidisciplinar capaz de evitar intervenções medicamentosas desnecessárias, mesmo perante um cenário clínico de alta complexidade pela concomitância da tetralogia de Fallot e da instabilidade hemodinâmica.




