HEMO 2025 / III Simpósio Brasileiro de Citometria de Fluxo
Mais dadosA doença falciforme é um conjunto de hemoglobinopatias hereditárias causadas por uma mutação no gene da β-globina, que leva à produção da hemoglobina S (HbS). Além das manifestações físicas, a carga mental atrelada à doença pode favorecer o desenvolvimento de transtornos afetivos, como ansiedade e depressão, sobretudo quando há isolamento social, tema ainda pouco explorado na população brasileira com essa condição.
ObjetivosInvestigar a saúde mental de indivíduos com doença falciforme, com ênfase nos traços afetivo-emocionais e engajamento social.
Material e métodosParticiparam 117 indivíduos, divididos em dois grupos: Doença falciforme (DF) (n=58; 33 mulheres) e Controle (C) (n=59; 34 mulheres). Os grupos foram pareados por idade (Mediana DF=30; C=29; p=0,19) e gênero (p=0,93). Os participantes responderam a instrumentos padronizados para avaliação de ansiedade, depressão, solidão, apoio social e a um questionário sociodemográfico. A coleta de dados ocorreu no Hemocentro de Belo Horizonte. O grupo DF foi abordado durante os atendimentos psicológicos ou na sala de espera de consultas; o grupo C, após o processo de doação de sangue. Os dados foram inseridos no sistema REDCap por dupla digitação e as análises estatísticas foram conduzidas por meio do software Statistica 10.0. Todos os procedimentos foram aprovados pelo CEP-Hemominas.
ResultadosDentre o grupo DF, os genótipos observados foram SS (57%), SC (15,5%) e S-beta-talassemia (5,1%); 22,4% não souberam informar. Indivíduos com DF apresentaram níveis elevados de depressão (Md DF = 16; IQR = 10-23; vs. Md C = 8; IQR 5-12; p < 0,001), ansiedade (Md DF = 12; IQR = 10-23 vs. Md C = 8,5; IQR = 5-17; p = 0,03) e solidão (Md DF = 40,5; IQR = 33-51 vs. Md C = 34; IQR = 27-42; p = 0,003), além de menor apoio social (Md DF = 39,5; IQR = 26-51; vs. Md C = 55; IQR = 41-68; p < 0,001), comparado ao C. Ainda no grupo DF, observou-se correlação entre depressão e ansiedade (r = 0,82; p < 0,05), e depressão e solidão (r = 0,70; p < 0,05). No grupo C, houve correlação entre apoio social e solidão (r = −0,56; p < 0,05). Pacientes com doença falciforme relataram maior frequência de diagnóstico em saúde mental comparado aos indivíduos controle (47,3% vs. 29,3%; p = 0,046), assim como maior uso de medicamentos psicotrópicos (p = 0,025). Dentre o grupo DF, aqueles que relataram terem recebido prescrição de medicamentos para transtornos de saúde mental, observou-se maior intensidade de depressão, ansiedade e solidão (p < 0,001), padrão não verificado no grupo controle.
Discussão e conclusãoOs dados apontam que a vivência com doença falciforme está associada a um nível maior de sofrimento psicológico, que pode ser atribuído à natureza crônica da doença e a estressores psicossociais. Observa-se a associação da depressão à solidão, sugerindo impacto do isolamento social percebido no convívio com a doença. Participantes com DF também exibiram diagnóstico pregresso de transtornos mentais, sugerindo a possível associação entre a vivência com a doença falciforme e uma maior vulnerabilidade à saúde mental. Destaca-se, portanto, a necessidade implementação de atenção psicológica ampliada nos centros de tratamento desses pacientes, com acesso a profissionais especializados em saúde mental, a fim de mitigar o sofrimento emocional e reduzir sub tratamentos, uma vez que o comprometimento da saúde mental pode não apenas reduzir a qualidade de vida, mas também agravar o quadro clínico.
Apoio financeiroFundação Hemominas; FAPEMIG.




