HEMO 2025 / III Simpósio Brasileiro de Citometria de Fluxo
Mais dadosA cistite hemorrágica viral é uma complicação conhecida após transplante de células-tronco hematopoiéticas (TCTH) devido a imunossupressão inerente a esta modalidade terapêutica. O adenovírus é uma causa importante, podendo cursar com hematúria persistente, disúria intensa, aumento de demanda transfusional e insuficiência renal, sendo seu manejo complexo. Descrevemos caso de cistite hemorrágica de difícil, porém bem-sucedido, controle no pós-TCTH alogênico.
Relato de casoMasculino, 52 anos, com diagnóstico de policitemia vera JAK2 V617F mutada em 2008, evoluindo para mielofibrose em 2022, com DIPSS plus e MIPSS70 de risco intermediário e citopenas persistentes, com alta necessidade transfusional de hemácias e plaquetas, sintomas B e esplenomegalia sintomática de cerca de 15 cm. Ruxolitinib e TCTH alogênico foram indicados. Infusão de 6 × 106 CD34+/kg células progenitoras provindas de doador haploidêntico (filho, 32 anos), fonte sangue periférico, condicionamento FluBu4Cy, profilaxia de doença do enxerto contra o hospedeiro (DECH ou GvHD) com Ciclofosfamida pós-transplante, micofenolato e ciclosporina (CsA). Ruxolitinib suspenso na aplasia. Enxertia neutrofílica no D+22. Evoluiu no D+60 com hematúria macroscópica, sendo iniciado hidratação e investigação. Seus exames demonstraram carga viral urinária > 2 × 10⁹ cópias/mL para adenovírus. Tentado redução da imunossupressão vigente (CsA) e posteriormente troca de CsA por sirolimo (até a suspensão no D+75) junto de sessões diárias de sessões de câmara hiperbárica, conforme sugestão da equipe de Infectologia. Paciente persistiu com hematúria e redução parcial da carga viral de adenovírus, sendo indicado terapia sistêmica com cidofovir (5 mg/kg)+probenecida e ciprofloxacino empírico. Não houve resposta clínica, havendo persistência da hematúria, culminando com queda de hemoglobina e necessidade de suporte transfusional intenso. Uma avaliação da equipe de Urologia foi solicitada, sendo realizado cistoscopia endoscópica via uretral que revelou interior do globo vesical universalmente friável com intensa cistite hemorrágica, sem possibilidade de qualquer cauterização ou remoção de coágulo. Optou‑se em infusão de cidofovir intravesical (375 mg com soro fisiológico 0.9% 100 mL) no D+90 e no D+105, sob sedação. Houve clareamento progressivo da urina e franca melhora sintomática e das citopenias. No D+106, paciente realizou reavaliação da doença oncohematológica de base, obtendo resultado de quimerismo em 97% do doador e JAK2 V617F indetectável. Nessa data, documentou-se negativação da carga viral sérica e urinária do adenovírus. O paciente recebeu alta hospitalar com seguimento ambulatorial e se encontra clinicamente bem até o momento da descrição deste relato.
ConclusãoHá poucos relatos da administração de cidofovir intravesical. Conforme descrito em séries de casos, nosso paciente teve resposta excelente com esta modalidade terapêutica, sem complicações renais e já tendo sido previamente exaurido as demais opções de antiviral endovenoso, redução da imunossupressão e abordagem urológica. O cidofovir intravesical é uma opção terapêutica para cistite hemorrágica por adenovírus em pacientes já sem imunossupressão e refratários a cidofovir endovenoso.




