A retinopatia falciforme é uma das principais complicações oculares das doenças falciformes, decorrente, sobretudo, de processos vaso- oclusivos e hipóxia. Sua fisiopatologia envolve episódios de isquemia-reperfusão, de ativação endotelial, de indução de cascatas inflamatórias, de adesão celular e de coagulação, que culminam em neovascularização patológica da retina, caracterizando a forma proliferativa da doença. Com o tempo, os neovasos podem se romper, provocando hemorragia vítrea, descolamento de retina e, consequentemente, perda visual.

Este estudo teve como objetivo caracterizar a retinopatia falciforme em retinas do modelo de camundongos humanizados Townes, por meio da análise morfológica da retina e de marcadores inflamatórios e angiogênicos.

A avaliação morfológica foi realizada em cortes histológicos de retinas de camundongos Townes-HbSS e controles C57BL/6J com oito meses de idade, por coloração de hematoxilina/eosina e imuno-histoquímica para marcadores angiogênicos: Fator de Crescimento Vascular Endotelial (VEGF) e Fator Induzido por Hipóxia 2 (HIF-2). A expressão gênica dos marcadores inflamatórios Interleucina 6 (IL-6), Interleucina 1 beta (IL- 1β) e Fator de Necrose Tumoral alfa (TNF-α), além dos angiogênicos VEGF e HIF-2, foram avaliados por RT-qPCR.

As análises morfológicas revelaram aumento significativo no número de vasos sanguíneos (p = 0,002), além de uma intensa marcação imuno-histoquímica de VEGF na camada ganglionar e de HIF-2 nas camadas ganglionar e plexiforme interna. Contudo, não foram observadas diferenças estatisticamente significativas na expressão das citocinas inflamatórias IL-6 (p = 0,901), IL-1β (p = 0,335) e TNF-α (p = 0,770) entre os grupos Townes-HbSS e controles. Em contrapartida, houve aumento significativo na expressão gênica dos fatores angiogênicos VEGF (p = 0,005) e HIF-2 (p = 0,039).

Os resultados indicam que, embora a inflamação crônica intrínseca à doença não tenha promovido aumento significativo das citocinas analisadas, há evidências de ativação de vias angiogênicas na retina dos animais do grupo Townes-HbSS. A investigação de outros mediadores inflamatórios, bem como de vias relacionadas ao estresse oxidativo, poderá contribuir para uma compreensão mais ampla dos mecanismos moleculares envolvidos nessa patologia ocular. Em conclusão, os dados obtidos confirmam que a retina dos camundongos Townes-HbSS apresenta características de isquemia, com evidências de angiogênese e neovascularização patológica, reforçando a relevância deste modelo para o estudo da retinopatia falciforme humana.