
O diagnóstico de tromboembolismo venoso (TEV) na infância aumentou nas últimas décadas. O avanço no reconhecimento dos eventos tromboembólicos, bem como as particularidades na população pediátrica, baseia-se principalmente na elaboração de registros, bancos de dados e estudos de coorte retrospectivos. Desde 2016, um registro prospectivo de tromboembolismo em crianças foi iniciado no Instituto da Criança/Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (ICR-HCFMUSP). O objetivo foi descrever o perfil epidemiológico da trombose venosa pediátrica em um serviço de saúde terciário em São Paulo.
MétodosAnálise retrospectiva do registro institucional de doença tromboembólica pediátrica (idade < 18 anos) de janeiro de 2016 a novembro de 2022. Foram avaliados dados demográficos, fatores predisponentes, local da trombose, diagnóstico radiológico, trombofilias, intervenções terapêuticas e desfechos.
ResultadosNo período do estudo, foram registrados 256 eventos, 142 (55,5%) afetando o sexo masculino. Foram relatadas 164 tromboses venosas, além de 66 tromboses intracardíacas e 26 embolias pulmonares. O sistema venoso superior foi sítio de TEV em 74 casos (28,9%) e o sistema venoso profundo inferior em 44 (17,2%). A trombose venosa cerebral foi diagnosticada em dezenove pacientes (7,4%) e em 27 crianças (10,5%) os eventos tromboembólicos foram em sítios incomuns. Um pico de prevalência foi observado em crianças de 1 a 5 anos, inesperadamente. Dos 256 eventos reportados, 198 (77,3%) estavam relacionados a cateter venoso central e 153 (59,7%) pacientes apresentavam infecção aguda. História prévia de doença crônica foi relatada em 69,9% dos pacientes registrados. As doenças mais prevalentes foram câncer (28,1%), doença renal (12,5%) e doença cardíaca (10,9%). A ultrassonografia doppler foi o exame mais utilizado para o diagnóstico de trombose venosa profunda (46,0%), seguida pela tomografia computadorizada em 46 pacientes (18,0%). O perfil de trombofilia foi investigado em 26 casos (10,2%); destes, seis (2,3%) apresentavam alterações. Terapia antitrombótica foi administrada em 86,0% dos eventos referidos, sendo heparina de baixo peso molecular utilizada isoladamente em 89,8% dos pacientes, seguida de heparina não fracionada. Trombólise após tratamento conservador foi realizada em oito pacientes (3,6%). O acompanhamento por imagem demonstrou recanalização em 71,0% dos eventos (total em 47,6% e parcial em 23,4%).
DiscussãoO presente estudo demonstrou concordância com a análise dos principais Bancos de dados e registros publicados na literatura. Os casos de TEV foram mais prevalentes no sexo masculino, associaram-se a dois ou mais fatores de risco em sua maioria, sendo o cateter venoso central o mais descrito, seguido de infeção e doença crônica. Ultrassonografia com estudo doppler foi o método diagnóstico por imagem mais utilizado, seguido de tomografia computadorizada. A pesquisa de trombofilia não foi realizada de rotina. A modalidade terapêutica mais utilizada, heparina de baixo peso molecular, também foi a mesma descrita na literatura.
ConclusãoApesar das limitações, este estudo oferece dados relevantes sobre TEV pediátrico em um serviço de saúde terciário no Brasil. Os resultados são semelhantes aos descritos em outros registros pediátricos e contribuem para o estabelecimento de uma rede para estudos futuros.