
A Púrpura Trombocitopênica Trombótica (PTT) é a principal microangiopatia trombótica adquirida em adultos, sendo uma condição rara, potencialmente grave e ameaçadora à vida. Está associada a deficiência de ADAMST13, sendo considerada uma patologia autoimune. A apresentação pode ser concomitante com outras doenças autoimunes, porém tem raros casos relatados com a doença de Graves, com apenas dez casos descritos na literatura, todos em pacientes do sexo feminino. O caso clínico descrito evidencia essa rara associação de doenças autoimunes em paciente do sexo masculino.
Relato de casoPaciente previamente hígido, de 44 anos, sexo masculino, apresentou déficit neurológico agudo (alteração visual, disartria, parestesia em hemicorpo esquerdo), sendo diagnosticado com acidente vascular cerebral isquêmico, porém notadas anemia e plaquetopenia. Seguiu em investigação ambulatorial, entretanto, após três meses do início do quadro, apresentou piora do déficit prévio, motivando novo internamento. Foi identificada anemia hemolítica microangiopática associada a plaquetopenia, com PLASMIC Score de 6, além de disfunção renal leve. Foram coletados exames para investigação e, então, iniciada corticoterapia associada à plasmaférese. A atividade de ADAMST13 < 0,2% com presença de inibidor confirmou o diagnóstico de PTT adquirida, e a dosagem dos hormônios tireoidianos indicou doença de Graves descompensada. O paciente evoluiu com melhora clínica após terapia inicial, associado a terapia antitireoidiana (Metimazol). Apresentou recaída após um mês, com resolução após nova pulsoterapia com corticoide e Rituximabe. O paciente segue com resposta completa, função tireoidiana normalizada, entretanto manteve discreta sequela neurológica, em reabilitação.
DiscussãoAs doenças autoimunes, no geral, apresentam uma clara predileção de gênero, sendo mais comuns em mulheres, ocorrendo em uma taxa de 2:1. Particularmente na PTT, o acometimento é cerca de duas a três vezes maior no sexo feminino; neste relato, porém, trazemos um paciente do sexo masculino com diagnóstico de duas enfermidades associadas a autoanticorpos, tornando a incidência ainda mais rara em homens. Nosso paciente apresentou ainda um quadro atípico de pelo menos três meses de evolução de quadro neurológico, e embora incomum, paciente manteve sequelas de AVC, achados confirmados em ressonância magnética. O acometimento renal, embora menos frequente, também esteve presente, manifestando-se como microalbuminúria e elevação de creatinina sérica, com melhora documentada após tratamento.
ConclusãoA associação entre PTT e doença de Graves tem demonstrado ser mais que uma mera casualidade. A adesão terapêutica da doença de Graves deve ser encorajada, já que o controle precário da doença parece estar relacionado à manifestação de outras condições autoimunes, incluindo a PTT. Por outro lado, pacientes com diagnóstico prévio de PTT, especialmente aqueles com agudizações frequentes ou doença grave, devem ser submetidos a avaliação tireoidiana e à investigação de outras doenças autoimunes, pois o tratamento dessas comorbidades pode contribuir para melhor controle e remissão da PTT.