
Descrever dois casos com desfechos diferentes de linfoma hepatoesplênico de células T gamma-delta (LHECTGD), entidade rara que corresponde a menos de 1% dos linfomas não-Hodgkin.
Caso clínicoCaso 1: Feminina, 71 anos, portadora de artrite reumatoide, HAS e glaucoma, internada por pancitopenia e pneumonia bacteriana sobreposta à infecção por COVID-19. Fazia seguimento há 2 anos com hematologia por anemia e plaquetopenia, sem exames diagnósticos. Em avaliação medular, imunofenotipagem de medula compatível com linfoma T hepatoesplênico (LTHE). Devido intercorrências infecciosas, paciente evoluiu para óbito antes do tratamento da doença hematológica. Caso 2: Masculino, 47 anos, avaliado em serviço de hematologia devido hepatoesplenomegalia, baço até 15cm do rebordo costal esquerdo (RCE), pancitopenia com neutropenia grau IV em hemograma inicial, descartadas infecções virais e leishmaniose visceral. Em avaliação medular, biópsia de medula óssea evidenciou infiltração por doença linfoproliferativa B e imunohistoquímica inconclusiva. Imunofenotipagem de aspirado de medula óssea compatível com infiltração por LTHE. O paciente recebeu tratamento com 6 ciclos de CHOEP e encontra-se com normalização de hemograma após último nadir, resposta clínica (redução do baço para 3cm RCE e melhora dos sintomas B), além de resposta em imagem no exame PET-CT. Atualmente, transplante autólogo em andamento no intuito de consolidação de resposta.
DiscussãoO LHECTGD tem pico de incidência em adolescentes e adultos jovens e uma razão homem/mulher de 9:1. É uma doença rara, visto que a maioria dos linfomas de células T expressa receptores alfa-beta e apenas 2-4% expressam receptores gamma-delta. Atualmente há pouco mais de cem casos descritos na literatura, sendo definido como um linfoma de proliferação maligna de células T nos sinusoides do fígado, na polpa vermelha do baço e na medula óssea. O fenótipo frequentemente exposto é de células T CD2+, CD3+, CD4-, CD5-, CD7+-, CD8-, com expressão de receptor célula T gama delta ou alfa beta. Dentre as anormalidades citogenéticas associadas, inclui-se o isocromossomo 7q com ou sem trissomia do 8. Clinicamente, os pacientes apresentam sintomas B, além de hepatoesplenomegalia acentuada, sem adenomegalias suspeita, o que aumenta o desafio diagnóstico e leva a inferências diagnósticas infecciosas e de hipertensão portal antes do diagnóstico hematológico. O tratamento engloba desde a intervenção cirúrgica, como a esplenectomia – no intuito de controlar o hiperesplenismo e evitar uma das principais causas de óbito, a ruptura esplênica –, além de quimioterapias baseadas em regimes que contenham etoposídeo, sem esquemas com relato de superioridade na literatura. O transplante autólogo (e em alguns relatos, o alogênico) foram indicados para consolidação quando há resposta ao tratamento.
ConclusãoO LHETGD é uma doença rara, de prognóstico reservado, com múltiplos relatos de atraso diagnóstico devido à ausência de sintomas específicos da doença. Recomenda-se, assim, que, diante de paciente jovens, com quadro de trombocitopenia ou alterações de outras linhagens e hepatoesplenomegalia, a hipótese diagnóstica de LHECTGD deve ser considerada. Em relação ao arsenal terapêutico disponível atualmente, novos estudos mostram-se necessários, objetivando melhorar a expectativa e qualidade de vida dos pacientes.