HEMO 2025 / III Simpósio Brasileiro de Citometria de Fluxo
Mais dadosO transplante hepático é um procedimento de alta complexidade, historicamente associado a perdas sanguíneas significativas e a necessidade de múltiplas transfusões. Considerando que as transfusões estão associadas a piores desfechos clínicos, torna-se essencial reduzir sua utilização de forma criteriosa, a fim de obter melhora dos resultados clínicos em pacientes submetidos ao transplante hepático.
ObjetivosAvaliar a correlação entre o uso dos diferentes hemocomponentes e hemoderivados na sobrevida em 28 dias após o transplante hepático.
Material e métodosEstudo clínico observacional, tipo coorte retrospectivo, que avaliou 622 transplantes hepáticos consecutivos, de Janeiro 2020 a Dezembro de 2023. O uso de produtos sanguíneos foi avaliado em 573 pacientes desde o período perioperatório até o 28° dia pós-transplante. A análise dos fatores de risco independentes de mortalidade precoce foi realizada por regressão de Cox uni e multivariada, ajustada pelo MELD, para minimizar a influência de fatores de confusão. A curva de sobrevida dos pacientes foi analisada por meio do estimador de Kaplan-Meier com IC 95% e a comparação entre os grupos foi realizada através do teste de Log-Rank.
ResultadosEntre os pacientes incluídos, 84,1% receberam transfusão e 15,9% não foram expostos a nenhum tipo de transfusão. Durante o período de avaliação, foram analisadas transfusões de 3.069 unidades de concentrados de hemácias (CH), 927 de plasma fresco congelado (PFC), 195 de crioprecipitados (CRIO), 484 de concentrados de plaquetas (CP), 1.262 g de concentrado de fibrinogênio (CF) e 36.000UI de Concentrado de Complexo Protrombínico (CCP). A média de utilização dos produtos sanguíneos durante o intra-operatorio foi de: 2,4 CHs (±2,8), 0,7 PFCs. (±2,0) 0,2 CRIOs(±1,5), 0,4 CP. (±0,6), 1,7g (±2,6) de CF e 36,6UI (±251) de CCP. Durante as primeiras quatro semanas após o transplante hepático, 14,5% evoluíram para óbito. A sobrevida global em 28 dias foi de 85,5% (IC 95% 82,7–88,4). Quanto a exposição a tranfusão, a sobrevida foi de 98,9% para os não transfundidos e 83,0% para os transfundidos. Na análise pelo teste de Long-Rank foi observado que os pacientes que receberam transfusão tiveram uma sobrevida significantemente menor (p < 0.001). Na análise multivariada, o uso de PFC (HR 1,05, IC 95% 1,01–1,09, p 0.011) e de CRIO (HR 1,09, IC 95% 1,05–1,14, p < 0.001) foi associado com o aumento do risco de óbito, independentemente do MELD. O uso de CF apresentou associação limítrofe (HR 1,08, IC 95% 1,00–1,17, p 0.058). As demais variáveis (CH, CP e CCP) não foram associadas de forma independente ao desfecho.
Discussão e conclusãoA utilização de hemocomponentes e hemoderivados durante e após o transplante hepático demonstrou associação com menor sobrevida em 28 dias, com destaque para o PFC e o CRIO, que se mantiveram como preditores independentes de mortalidade precoce mesmo após o ajuste pelo MELD. Por outro lado, as associações iniciais observadas com CH e CP perderam significância, sugerindo que esses componentes podem estar mais relacionados à gravidade clínica prévia do paciente do que a um efeito causal direto. O MELD se mostrou uma estratégia relevante, mas não suficiente para controlar todos os potenciais confundidores, uma vez que não se associou a mortalidade, possivelmente devido à homogeneidade de seus valores.Tais resultados evidenciam a importância da adoção e fortalecimento de estratégias de Patient Blood Management (PBM), com foco na redução de transfusões potencialmente evitáveis e melhores resultados clínicos.




