
Vinorelbina é um antineoplásico semisintético, alcaloide da vinca, cujo uso foi ampliado como adjuvante na mobilização de Células-Tronco Hematopoéticas (CTH) na era da Terapia Celular. Neste trabalho, relatamos dois casos que mobilizaram com Fator Estimulador de Colônias de Granulócitos (GCSF) e Vinorelbina para Transplante de Células Tronco Hematopoiéticas (TCTH) Autólogo e evoluíram com íleo paralítico.
RelatosHomens, 55 anos (caso 1) e 57 anos (caso 2), mobilizaram conforme protocolo da instituição: Vinorelbina 35 mg/m2 EV (D1) e GCSF 5 μg/kg SC 2×/dia a partir do D4 e programação de leucaférese no D8, se nível adequado de CD34+ em Sangue Periférico (SP). Caso 1, Mieloma Múltiplo, após 3 ciclos de Dara-VTD, apresenta no D7 da mobilização, quadro de neutropenia febril (Leucócitos = 500/mm3, Neutrófilos = 0) com distensão abdominal expressiva, dolorosa e constipação intestinal. Tomografia (TC) de abdome: distensão de alças colônicas, sem pontos obstrutivos; feita hipótese de íleo paralítico com possível colite infecciosa. Realizado Meropenem e cancelada coleta de CTH. Neutropenia e íleo paralítico foram atribuídos à Vinorelbina. Posteriormente, coletou CTH com GCSF e Plerixafor, sem intercorrências, realizando TCTH Autólogo com sucesso. Caso#2, Linfoma T Periférico, tratado com 3 linhas prévias: inicialmente CHOEP; após recidiva precoce, DHAP e GEMOX. Ao internar para coleta de CTH, constipado desde D3, inicia com inapetência, distensão e dor abdominal. Evolui com parada total na eliminação de fezes e flatos, picos pressóricos e vômitos biliosos. TC de abdome: coprostase, dilatação de alças colônias e gástrica, sem obstrução; hipótese de íleo paralítico secundário ao quimioterápico. Otimizado medidas laxativas com resposta progressiva. Infelizmente apresentou falha de mobilização, mas segue em Resposta Completa no PET.
DiscussãoTCTH Autólogo é importante estratégia terapêutica para malignidades hematológicas, sobretudo Mieloma Múltiplo e Linfomas Recidivados e Refratários, melhorando Sobrevida Global e Sobrevida Livre de Doença. Após advento do GCSF, o SP tornou-se a principal fonte de CTH, mas seu uso isolado nesses pacientes têm maior risco de falha da mobilização (até 30% dos casos), por pior reserva medular e toxicidade cumulativa dos tratamentos prévios. Plerixafor, antagonista CXCR-4, tem alta eficácia, porém elevado custo e indisponibilidade no SUS. A associação de GCSF com quimioterapia em altas doses, como ciclofosfamida, é eficaz e acessível, mas com maior índice de neutropenia e risco de infecção e pico de CD34 em SP menos previsível. Estudos em Mieloma e Linfoma mostraram bons resultados, segurança e alta previsibilidade do pico de CD34 com Vinorelbina associada ao GCSF, sendo preferível em vários centros transplantadores do Brasil. O perfil de toxicidade é favorável e, embora constipação e desconforto abdominal sejam achados comuns, em geral são de leve intensidade. É pouco descrita na literatura evolução para íleo paralítico. A neurotoxicidade pela Vinorelbina, menor que em outros alcaloides da vinca, pode induzir neuropatia autônoma e, consequentemente, obstrução intestinal ou íleo paralítico.
ConclusãoOs casos acima são raros, mas graves. Devem ser abordados precocemente e reconhecê-los é essencial, sobretudo atualmente, em que mais TCTH Autólogos são indicados e Vinorelbina mais utilizada.