
Relatar caso de Histiocitose de Células Azul Marinho, doença com poucos casos relatados em literatura, aqui representada em paciente jovem, sem comorbidades e sem doença hematológica subjacente, apresentando-se com tríade clássica da doença.
Relato de casoPaciente feminina, 37 anos, encaminhada ao serviço terciário de Hematologia para investigação de plaquetopenia moderada de início há dois anos, notada durante rotina de pré-natal (60-100 mil/mm3), associada à esplenomegalia de monta evidenciada em exame físico recente (em torno de 15 centímetros abaixo do rebordo costal esquerdo). Não apresentava sintomas B. Sem outras alterações ao exame físico geral e segmentar. Negava comorbidades prévias conhecidas, apresentando apenas hipertrigliceridemia (380 mg/dL) em exames de rotina anteriores à consulta. Esfregaço de sangue periférico mostrando plaquetopenia verdadeira, sem macroplaquetas, displasia ou reação leucoeritroblástica. Sorologias negativas. Sem alterações de função hepática. Exames de imagem mostrando esplenomegalia heterogênea com múltiplas lesões nodulares focais hipoatenuantes e índice esplênico de 2475 (Normal até 480), sem linfonodomegalias. Mielograma hipercelular, com presença de infiltrado medular de histiócitos insuflados com coloração azul marinho, sem displasias ou aumento de células imaturas. Realizada esplenectomia diagnóstica pelas características do baço, a fim de aumentar leque de diagnósticos diferenciais. Estudo Anátomo-patológico do baço mostrou população histiocítica de imunofenótipo não Langerhans e padrão xantomatoso. Estudo molecular negativo para BCR-ABL p210 e mutação JAK-2 V617F. Citogenética: cariótipo 46,XX,t(3;12)(p25;p13).
DiscussãoHistiócitos Azul Marinho podem estar presentes em uma síndrome genética rara de forma primária ou, mais freqüentemente, como fenômeno secundário à alto turnover celular associado a doenças hematológicas, metabólicas ou miscelânea de fatores - os mais frequentemente relatados são doenças mieloproliferativas agudas e crônicas, linfomas, síndromes mielodisplásicas, plaquetopenia imune, nutrição parenteral, doenças de depósito e uso de Anfotericina B. Pacientes com a variante primária costumam apresentar-se com a tríade: plaquetopenia, esplenomegalia e hipertrigliceridemia. A maioria desses pacientes apresenta mutação no gene da apolipoproteína E, carreado no braço longo do cromossomo 19, exame indisponível em nosso serviço. No entanto, de acordo com a apresentação clínica e exames complementares subsidiários, pôde-se excluir causas secundárias como causa do quadro da paciente aqui apresentada.
ConclusãoA partir da investigação de plaquetopenia e esplenomegalia em paciente jovem, após associação da clínica, estudo medular, exame anatomopatológico esplênico e provas moleculares, chega-se ao diagnóstico de Histiocitose de Células Azul Marinho, possivelmente primária, doença rara e com evolução clínica variável, sendo que a maioria dos pacientes apresenta curso indolente, mantendo apenas seguimento clínico periódico. Paciente segue em consultas trimestrais, assintomática e sem novas alterações ao exame físico.