
Apresentar aspectos clínicos, diagnósticos e terapêuticos de um caso incomum de Granulomatose Linfomatoide (GL).
Relato de casoPaciente do sexo feminino, 60 anos, ex-tabagista e pneumopata, foi diagnosticada com Mieloma Múltiplo em 2017 e tratada com terapia de indução seguida de transplante autólogo tandem associado a lenalidomida de manutenção por 40 meses, sendo a terapia suspensa por toxicidade hematológica em fevereiro/2022. Manteve remissão estrita, porém iniciou quadro de neuropatia periférica progressiva, extensamente investigado pela neurologia e inicialmente tratado com imunoglobulina endovenosa por suspeita de síndrome de Guillain Barré. Por piora neurológica, com dor neuropática e paraparesia, foi realizado estudo medular, que não evidenciou plasmocitose, mas malacoplaquia – alteração normalmente relacionada a infecção granulomatosa. Nas semanas seguintes a paciente evoluiu com febre diária, hepatoesplenomegalia, micronódulos pulmonares e hepáticos, sendo internada para elucidação diagnóstica. Diante da hipótese de etiologia infecciosa, recebeu amplo tratamento antimicrobiano empírico, incluindo esquemas antifúngicos e para micobacterioses. Sem melhora clínica, realizou PET-CT que demonstrou hipercaptação em lesões pulmonares e hepáticas, adenomegalias torácicas e retroperitoneais, além de lesões musculares. Submetida a biópsia de lesão nodular em coxa direita com anatomopatológico consistente com Granulomatose Linfomatoide Grau 3 e PCR para EBV sérico de 5755 UI/mL. Diante do diagnóstico, foi iniciado tratamento com R-DA-EPOCH sendo necessária sua interrupção após 2 ciclos devido intercorrências graves relacionadas ao esquema (toxicidade hematológica, colite neutropênica, insuficiência respiratória e choque séptico). Atualmente, paciente em proposta de rituximabe semanal, com último PCR para EBV indetectável e PET-CT em resposta completa.
DiscussãoA GL é uma linfoproliferação associada ao EBV que ocorre em pacientes imunossuprimidos. É uma desordem rara, com prevalência atualmente incerta. Tipicamente acomete pacientes na 4ª a 6ª décadas de vida, com apresentação predominantemente extranodal e envolvimento pulmonar >90% dos casos. Outros sistemas comumente acometidos são: neurológico, dermatológico, renal e hepático. Do ponto de vista laboratorial, a avaliação sorológica evidencia exposição prévia ao EBV, normalmente sem achados de infecção aguda. A doença é caracterizada por 3 graus histológicos, sendo o baixo grau (G1/2) relacionado a disfunção imune, o que permite abordagens terapêuticas como suspensão de imunossupressores, uso de anticorpos monoclonais anti-CD20, corticoterapia, interferon-alfa ou apenas observação. Já a apresentação de alto grau histológico (G3), uma linfoproliferação independente do efeito imune relacionado ao EBV, é tratada com esquemas quimioterápicos para linfomas B agressivos. A literatura é baseada em relatos de caso e estudos não controlados. O único estudo prospectivo, conduzido ao longo de 27 anos, encontrou sobrevida livre de progressão e sobrevida global de 28% e 66%, respectivamente, após tratamento com DA-EPOCH em 18 pacientes com doença de alto grau. Em casos refratários ou recidivados o transplante de células tronco hematopoiéticas pode ser uma opção.