
Descrever um caso de Linfoma Hepatoesplênico Gama-Delta (LHGD) com diagnóstico após imunossupressão crônica.
IntroduçãoO Linfoma Hepatoesplênico Gama-Delta é uma neoplasia muito rara e de rápida progressão, derivada de células T citotóxicas duplo-negativas (CD4-CD8-), usualmente positivas para o receptor TCR gama-delta, que podem expressar marcadores de células NK. O pico de incidência é em adultos jovens do sexo masculino. Apesar de rara, há uma associação conhecida com imunossupressão crônica, como pacientes receptores de órgãos sólidos ou uso de azatioprina e ifliximab em pacientes com doenças inflamatórias intestinais (Pro et al., 2020).
Caso clínicoPaciente masculino, 56 anos, com diagnóstico de retocolite ulcerativa há 3 anos, em uso crônico de azatioprina, procurou serviço hematologia em setembro/2021 pois exame admissional mostrou leucopenia e plaquetopenia discretos. Ao exame físico apresentava esplenomegalia discreta, sem outras alterações. Fez exame de medula óssea com imunofenotipagem que foi considerado normal. Na época suspendeu o imunossupressor por suspeita de ser leucopenia relacionada a droga, e fez tratamento empírico com um curso de corticosteroide via oral (sic). O paciente não voltou ao serviço de saúde até fevereiro/2022 quando procurou hepatologista por quadro de icterícia associada a febre, perda de peso e piora do estado geral. Ao exame observou-se aumento da esplenomegalia, sem linfonodomegalias ou outras massas. Hemograma com 1070 leucócitos e neutropenia severa (menos de 100/uL). Foi solicitado um exame de subpopulações linfocitárias onde foi confirmada neutropenia e vistos 25% de linfócitos T/NK (CD2, CD3, CD7 e CD56 fortes), duplo-negativas (CD4 e CD8 negativos), positivas para o receptor do TCR gama-delta. Enquanto aguardava o resultado da biópsia hepática, a avaliação da medula óssea confirmou infiltração por células anormais de aspecto imaturo, positivas para CD3, CD2, CD7 e CD56 fortes, também positivas para CD16 e CD94. Apesar da dúvida em se tratar de linfoma T/NK, confirmou-se a presença de expressão forte do TCR gama-delta. A biópsia hepática mostrou necrose hepática extensa em pontes e colestase moderada. Com a piora rápida da neutropenia e falência hepática progressiva, foi optado por tratamento com quimioterapia intensiva. O paciente encontra-se com discreta melhora clínica há uma semana.
DiscussãoO linfoma hepatoesplênico de células T gama-delta é caracterizado por uma proliferação de células T maduras infiltrando-se nos sinusóides do fígado e baço. Clinicamente os pacientes apresentam dor abdominal, fraqueza, hepatoesplenomegalia e trombocitopenia acentuada, além de sintomas sistêmicos e ausência de linfadenopatia. Na avaliação bioquímica é possível observar alterações hepáticas como aumento das transaminases e da fosfatase alcalina, anemia, pancitopenia e o aumento da LDH. As citopenias podem ser devidas a hiperesplenismo, infiltração da medula óssea, liberação de citocinas, ou ainda imuno-mediadas. Embora linfocitose seja incomum, uma pequena população de linfócitos T anormais pode ser detectada por citometria de fluxo. Foram relatados mais de 30 casos deste linfoma envolvendo pacientes com doença inflamatória intestinal desde 1996, a qual está especialmente relacionada ao uso de terapias anti-TNF e imunomoduladores como azatioprina e 6-mercaptopurina.
ConclusãoDescrevemos aqui um caso raro de LHGD após uso crônico de azatioprina para retocolite ulcerativa, diagnosticado através da análise de sangue periférico.