
A anemia falciforme (AF) é uma condição genética caracterizada pela presença de uma hemoglobina anormal chamada de HbS devido a uma mutação com substituição do aminoácido ácido glutâmico pela valina no sexto códon do gene HBB. Esta hemoglobina polimeriza em situações de estresse e hipóxia, causando a alteração do formato da hemácia de disco bicôncavo para foice, a qual possui um tempo de vida menor e é mais aderente ao endotélio dos vasos, predispondo crises vaso-oclusivas. As consequências da oclusão de vasos incluem crises de dor, isquemia, infartos em múltiplos órgãos e até mesmo alterações orais e faciais, ainda negligenciadas, ao considerar a escassez de trabalhos acerca do tema e de guidelines acerca do manejo e tratamento de pacientes com AF no ponto de vista ortodôntico. Dessa forma, esta revisão tem por objetivo avaliar os dados disponíveis na literatura acerca da relação entre anemia falciforme e as desordens craniofaciais.
Material e métodosEsta revisão sistemática seguiu as etapas do Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses (PRISMA), sendo feito o registro na International Prospective Register of Systematic Reviews (PROSPERO) (CRD42024508127). A pergunta norteadora do trabalho foi: “existe relação entre desordens craniofaciais e anemia falciforme?”. Realizou-se a busca de artigos em Inglês, Portugês e Espanhol nas bases de dados PubMed, Scopus, LILACS, SciELO e EMBASE até dezembro de 2023, sob os descritores: sickle cell disease AND craniofacial disorders OR maxillofacial disorders AND sickle cell anemia OR craniofacial abnormalities AND sickle cell disease OR craniofacial development AND sickle cell anemia.
ResultadosA busca na literatura resultou em 2500 artigos, dos quais foram excluídos 618 duplicados e 1850 após a leitura de título e resumo. Os 32 artigos restantes foram lidos na íntegra, e apenas seis foram incluídos nesta revisão por abordarem o tema proposto. Desses estudos incluídos, quatro eram do tipo transversal, um, longitudinal e um, coorte retrospectiva. No total, 323 indivíduos com AF com idades variando de três a 60 anos tiveram suas características craniofaciais analisadas. Os estudos demonstraram que falcêmicos apresentam variações no conduto auditivo externo, na base do osso occipital e depressão da ponte nasal. Ademais, indivíduos com AF apresentam tendência a ter um padrão esquelético classe II, perfil facial convexo, retrusão mandibular, aumento do plano mandibular e protrusão maxilar. A maioria dos estudos indica também que a má oclusão moderada e severa é uma condição de alta prevalência associada à AF.
DiscussãoAs alterações craniofaciais identificadas em pacientes com AF estão associadas ao desenvolvimento anômalo dos ossos, tendo em vista as crises vaso-oclusivas na microcirculação durante toda a vida do indivíduo. A protrusão maxilar, por exemplo, tem sido explicada pela hiperplasia da medula óssea devido à anemia hemolítica. Tais alterações são relevantes, já que o padrão esquelético classe II pode trazer não só frustração ao paciente com AF no ponto de vista estético, mas também disfunções em mastigação, deglutição, respiração e fala.
ConclusãoDessa forma, a detecção das desordens craniofaciais na AF é essencial para que profissionais, como cirurgiões dentistas, saibam como manejar os casos e indicar o melhor tratamento.