
O desconforto respiratório relacionado à transfusão ocorre em reações transfusionais imediatas de várias causas que devem ser diferenciadas. A mais frequente é a Sobrecarga Circulatória Relacionada à Transfusão(TACO), caracterizada por edema pulmonar agudo de origem cardiogênica. Ocorre em pacientes suscetíveis à sobrecarga de fluidos, como idosos, portadores de cardiopatia ou insuficiência renal. O principal diagnóstico diferencial é com a Lesão Pulmonar Aguda Relacionada à Transfusão(TRALI), uma reação imunológica rara, caracterizada por edema pulmonar não cardiogênico. O principal mecanismo é a ativação de neutrófilos após a infusão de hemocomponentes contendo anticorpos anti-HLA e/ou anti-HNA, levando à inflamação e edema alveolar. Outras causas de desconforto respiratório são as reações alérgicas, contaminação bacteriana, embolia aérea e dispnéia associada à transfusão (DAT).
ObjetivosAvaliar retrospectivamente os casos de desconforto respiratório agudo relacionado à transfusão da Clínica de Hemoterapia quanto às possíveis causas.
Material e métodosForam avaliados os casos de desconforto respiratório agudo notificados entre outubro/15 e outubro/19, tendo como critério de inclusão a presença de dispnéia. Por ser anterior à pandemia, este estudo não incluiu pacientes portadores de Covid-19.
ResultadosForam identificados 41 casos de desconforto respiratório agudo durante ou até 6 horas após a transfusão, em 30 pacientes femininos (73,17%) e 11 masculinos (26,83%), com idades entre 7 e 99 anos, sendo 26 (63,41%) acima dos 60 anos. Quanto aos hemocomponentes transfundidos, 34 pacientes receberam apenas concentrados de hemácias, 1 apenas concentrados de plaquetas, 1 apenas plasma fresco e 5 receberam múltiplos hemocomponentes. A dispnéia ocorreu em 100% dos casos (critério de inclusão), sendo acompanhada de hipertensão arterial em 17 pacientes (41,46%), hipotensão em 3 (7,32%) e febre em 1 (2,44%). Dos 24 pacientes submetidos à avaliação radiológica e/ou tomografia de tórax, 22 apresentavam alterações sugestivas de congestão pulmonar. A ventilação mecânica foi necessária em 11 pacientes (26,83%). Quase todos evoluíram com regressão do quadro respiratório após uso de diuréticos, corticóides, anti-hipertensivos e suporte de oxigênio. Apenas 1 foi a óbito. A maioria dos pacientes teve o diagnóstico de provável TACO e apenas 1 foi diagnosticado como provável TRALI.
DiscussãoA maioria dos casos ocorreu em pacientes idosos (acima de 60 anos), portadores de comprometimento cardíaco prévio e outras comorbidades associadas, que não toleraram receber grandes volumes em curto espaço de tempo. Portanto é importante identificar os pacientes de maior risco de desenvolverem esta complicação e adotar medidas preventivas como a transfusão lenta ou em alíquotas e o maior intervalo entre a administração dos hemocomponentes. Muitas vezes é levantada a suspeita de TRALI, mas as limitações técnicas para confirmação do diagnóstico (identificação do anticorpo anti-neutrofílico) dificultam a diferenciação com outras síndromes respiratórias.
ConclusãoÉ necessário definir critérios e facilitar a execução de testes diagnósticos mais precisos para diferenciar as síndromes respiratórias relacionadas à transfusão, além de intensificar a adoção de medidas preventivas.