A anemia hemolítica por anticorpos frios é uma entidade nosológica que se caracteriza pela presença de anticorpos monoclonais, em sua maioria IgM, dirigidos a antígenos eritrocitários e cuja aglutinação pode ocorrer em temperaturas normalmente atingidas em extremidades do corpo. Na literatura, há relatos de anemias hemolíticas microangiopáticas com dispositivos de assistência ventricular e autoimunes por anticorpos frios em procedimentos que envolvem resfriamento corporal (como circulação extracorpórea). Já em contexto de hemodiálise, há escassez de evidências semelhantes, com relatos anedóticos de anemia hemolítica autoimune dirigida ao antígeno N em pacientes cujos capilares do aparelho foram reutilizados após esterilização com formaldeído. No nosso serviço, encontramos um diagnóstico incomum de anemia hemolítica associada ao frio pelo banho da hemodiálise. Relato de caso: Paciente feminina, 57 anos, portadora de hepatite C em tratamento com glecaprevir e pibrentasvir iniciado há menos de 1 mês, doença renal crônica por rins policísticos, em início de hemodiálise há 2 anos, deu entrada no Hospital das Clínicas da USP com história de 2 meses de evolução de astenia e eventual necessidade de transfusão de concentrado de hemácias, marcadamente piores no dia que sucedia a sessão de hemodiálise.À admissão, apresentava hemoglobina de 4,4g/dL, VCM 115 fL, RDW 26,5%, plaquetometria de 152.000/mm3, haptoglobina menor que 10mg/dL, reticulócitos de 8%, desidrogenase lática 340 U/L e bilirrubina indireta de 0.65mg/dL. A etiologia da anemia hemolítica se revelou imune, com teste da antiglobulina direto (TAD) evidenciando IgG, C3d e IgM. À eluição, houve a descrição de autoanticorpo eritrocitário IgG de especificidade indeterminada. Já na identificação de anticorpos irregulares (PAI), houve aglutinação à temperatura de 4°C, mas não à temperatura ambiente. Por haver autoIgG no TAD, a paciente foi tratada com metilprednisolona 1g por 3 dias e imunoglobulina intravenosa, sem melhora do quadro, motivando a transfusão de 2 concentrados de hemácias ao longo da internação. Recebeu alta hospitalar com Hb 9,6g/dL, mas três dias após, retornou com o mesmo quadro clínico, desta vez com hemoglobina de 2,6g/dL, tendo feito hemodiálise no dia anterior. Foi tratada novamente, e a partir desta internação, recebeu recomendação de hemodiálise com banho aquecido e desde que tal medida foi adotada, não mais apresentou crises hemolíticas. Atualmente, houve normalização das provas de hemólise. Conclusão: O caso apresentado mostra uma situação de anemia hemolítica relacionada à exposição ao banho frio da hemodiálise. Apesar de termos encontrado IgGs ligadas às hemácias do TAD, o nexo temporal com a exposição ao frio e a ausência de resposta ao corticoesteróide levou a equipe a questionar a real participação desta na hemólise. Contudo, ao se realizar a eluição, foi esta IgG o único anticorpo isolado, diferentemente da IgM que esperávamos encontrar, sugerindo duas hipóteses: A anemia hemolítica poderia se dever a uma IgG com labilidade térmica e que aglutinava no frio, em um mecanismo semelhante à IgG de Donath-Landsteiner, ou a uma IgM que não fora identificada na eluição, e que não levou a níveis de C3d altos. Para todos os efeitos, a correlação com o frio da hemodiálise, uma vez elucidada, permitiu que a paciente pudesse fazer o procedimento três vezes por semana, com banho aquecido, sem mais intercorrências.
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