
Descrição de diagnóstico e condução de caso de anemia ferropriva secundária a causa incomum.
Material e métodosRelato de caso descritivo, a partir de dados de prontuários eletrônicos, com consentimento do paciente.
ResultadosPaciente de 31 anos, sem uso de medicamentos contínuos e sem comorbidades conhecidas. Relato de vertigem, astenia, náusea e palpitações há aproximadamente um mês. Admitido em consultório de hematologia com os seguintes exames - Hb 5,7 g/dL; VCM 58 fl; HCM 15; RDW 19%; Série branca e plaquetária dentro da normalidade. Ferro sérico 11 ug/dL; Ferritina 1.9 ng/mL; Saturação de transferrina (ST) 2%. Negou exteriorização de sangramentos, alterações de hábito intestinal ou perda ponderal. Exame físico sem alterações relevantes além de palidez cutâneo-mucosa intensa. Indicado avaliação de trato-gastrointestinal e reposição com derisomaltose férrica 1.5 g parenteral seguido de glicinato férrico 300 mg em duas tomadas diárias. Quinze dias após, apresentou resposta parcial ao tratamento, apresentando Hb 9,8 g/dL; VCM 78 fl; reticulócitos 85.850/uL; ferritina 26 ng/mL; ST 31%. Realizou endoscopia digestiva alta e colonoscopia, ambas sem evidência de focos ativos de sangramentos que justificassem o quadro. Naquele momento, optado em acompanhar a evolução com a reposição oral de ferro. Paciente apresentou nova queda de hemoglobina em trinta dias após os exames, atingindo Hb de 6.7 g/dL, mantendo ferropenia. Indicado cápsula endoscópica e nova infusão de ferro parenteral. O exame de imagem revelou “segmento curto, cerca de 1min de gravação, do terço médio do delgado com diversas áreas elevadas, vermelhas, sem padrão vilositário, com pontos esbranquiçados superficiais e dispostos de forma circunferencial além de sangue vivo e melena na região e em todo o restante do íleo, podendo corresponder a linfangioma”. Foi encaminhado para avaliação da equipe de Cirurgia do Aparelho Digestivo com Hb de 11,1 g/dL, após a última reposição parenteral de ferro. Indicado abordagem cirúrgica. Realizado enterectomia do segmento e anastomose entero-entérica latero-lateral via laparoscópica. Recebeu orientações de dieta leve e alta hospitalar no primeiro dia de pós-operatório. O anátomo-patológico e a imunohistoquímica do produto da enterectomia descreveram proliferação circunscrita de vasos dilatados de parede fina, que se anastomosam, sem atipias das células endoteliais de revestimento, atingindo mucosa e submucosa, com positividade para CD31, Podoplanina (D2-40), ERG e negativo para Herpes Vírus Humano tipo 8 (HHV8), compatível com linfangioma. No momento, paciente clinicamente bem, assintomático, em acompanhamento trimestral. Apresenta aumento progressivo dos níveis de hemoglobina (último em faixa de 12 g/dL), mantendo 200 mg de ferro elementar diários com proposta de suspensão após resolução da anemia.
DiscussãoLinfangiomas são má-formações tumorais raras, benignas, originadas de vasos linfáticos, frequentemente assintomáticos. O diagnóstico de nosso paciente foi estabelecido após a confirmação de anemia ferropriva sintomática, sendo investigado com a avaliação endoscópica do trato gastrointestinal e possibilitando o tratamento cirúrgico. O desenvolvimento de novas lesões é possível, justificando seguimento regular.
ConclusãoLinfangiomas intestinais podem provocar hemorragias imperceptíveis. A cápsula endoscópica é útil na investigação de anemia ferropriva com colonoscopia e endoscopia alta sem claros focos de hemorragias.