Apresentação do caso: Doador de aférese de repetição, masculino, 61 anos, realizou doação voluntária de plaquetas por aférese, sem intercorrências. Na avaliação microbiológica do hemocomponente, 24 horas após a coleta, foi observada positividade na cultura nos frascos aeróbio e anaeróbio através do sistema de detecção microbiana BACT/ALERT®. Na identificação bacteriana foi isolado o microrganismo Streptococcus gallolyticus. Após confirmação do resultado da cultura, o componente foi descartado e o doador foi contatado para retornar ao serviço para investigação. Ao exame clínico, o doador encontrava-se assintomático, negou histórico pessoal de neoplasias e relatou nunca ter realizado colonoscopia. Referiu histórico familiar paterno positivo para adenocarcinoma de cólon. Foi coletada nova hemocultura, que retornou negativa, e foi solicitada colonoscopia. Na colonoscopia foi evidenciada estrutura polipóide pediculada em cólon ascendente, tendo sido realizado polipectomia com alça diatérmica. Em cólon descendente, outras duas estruturas polipóides pediculadas foram visualizadas. Os demais segmentos colônicos estavam inalterados. No anatomopatológico da amostra coletada, foi evidenciado adenoma tubular com displasia de baixo grau. Discussão:Streptococcus gallolyticus é uma subespécie de bactéria pertencente ao complexo Streptococcus bovis e, frequentemente, está presente na microbiota intestinal dos seres humanos. Esse microrganismo tem sido associado com endocardite e lesões colorretais. Lee et. al., 2013 detectou, em um período de 14 anos, 16 doadores assintomáticos com cultura positiva para Streptococcus bovis, e também verificou forte correlação entre esta bactéria e carcinoma de cólon e adenoma. Neste caso o concentrado de plaquetas por aférese não foi transfundido em nenhum paciente devido ao resultado positivo na avaliação microbiológica, evitando assim a possibilidade de uma reação transfusional. Chang et.al., 2004 relatou um caso de choque séptico após transfusão de um concentrado de plaquetas contaminado com Streptococcus bovis, assim como Niger et. al., 2014 também reportou um caso de reação transfusional devido à um concentrado de plaquetas contaminado com Streptococcus gallolyticus. A contaminação bacteriana em concentrados de plaquetas é a complicação infecciosa mais comum relacionada à transfusão, o risco de sepse após transfusão de plaquetas é de aproximadamente 1:50.000 e representa uma importante causa de morbidade e mortalidade na medicina transfusional (CHANG et.al., 2004). Conclusão: Este caso reforça a importância da avaliação microbiológica dos concentrados de plaquetas e da necessidade de medidas apropriadas para limitar o risco de contaminação bacteriana no contexto da segurança transfusional, pois as consequências da transfusão de um componente contaminado podem ser graves e até fatais. A identificação do microrganismo envolvido também é relevante para determinar a origem da contaminação bacteriana, bem como auxiliar na investigação e diagnóstico de doenças em doadores assintomáticos. Ainda, fica evidente a importância do rastreio de alterações intestinais através de colonoscopia quando houver presença de Streptococcus gallolyticus em hemocultura, pois o diagnóstico e intervenção precoce reduzem significativamente a morbimortalidade no câncer colorretal.