HEMO 2025 / III Simpósio Brasileiro de Citometria de Fluxo
Mais dadosA hiperbilirrubinemia é uma manifestação incomum no linfoma de Hodgkin clássico (LHc), associada a causas como hemólise, hemofagocitose, obstrução biliar e síndrome dos ductos evanescentes. Sua presença impõe desafios terapêuticos, pois a disfunção hepática pode potencializar a toxicidade de quimioterápicos metabolizados no fígado, demandando ajustes de dose baseados nos níveis séricos de bilirrubina e/ou transaminases. A escassez de dados sobre o manejo e o prognóstico desses pacientes torna seu tratamento um desafio clínico e reforça a importância de novas investigações.
ObjetivosDescrever as características clínico-laboratoriais, a evolução laboratorial e o perfil de toxicidade durante o tratamento de pacientes com LHc e hiperbilirrubinemia ao diagnóstico. Como objetivo secundário, propõe-se comparar a sobrevida global (SG) e a sobrevida livre de progressão (SLP) com pacientes sem hiperbilirrubinemia.
Material e métodosTrata-se de uma coorte retrospectiva unicêntrica (HC-FMUSP/ICESP) incluindo pacientes >16 anos, diagnóstico de LHc, bilirrubina total (BT) ≥1,2 mg/dL ao diagnóstico - sendo bilirrubina direta > indireta, tratados com protocolo ABVD e BEACOPP em primeira linha entre 2010 e 2020 (grupo H). O grupo controle (grupo C) foi selecionado por escore de propensão (ajustado para IPS, ECOG e estadiamento) a partir do registro de LH do ICESP no mesmo período. Foram coletados dados clínicos e laboratoriais, doses de doxorrubicina utilizadas e cinética de decaimento da bilirrubina. Toxicidades foram graduadas pelo CTCAE v5.0 e avaliadas por ciclo. SG e SLP foram estimadas por Kaplan-Meier e comparadas pelo teste de log-rank. Foi realizada análise de riscos proporcionais de Cox para avaliar o impacto de fatores prognósticos, incluindo IPS, estadiamento, ECOG e níveis de bilirrubina em relação a SG e SLP.
ResultadosForam analisados 56 pacientes no grupo H (mediana da bilirrubina total: 4,0 mg/dL; IQ 2–8) e 142 no grupo C. A principal causa de hiperbilirrubinemia foi infiltração hepática (55%), seguida por causa indeterminadas (29%) e hemofagocitose (14%). O grupo H apresentou maior proporção de homens, pacientes HIV+, e casos de anemia, leucopenia ou linfopenia ao diagnóstico quando comparado ao grupo C. Entre 48 pacientes avaliados para dose de doxorrubicina e toxicidade, 16 receberam ajuste conforme bula e 32 receberam doses acima do recomendado em pelo menos um ciclo. Doses acima do preconizado associaram-se a maior necessidade transfusional no primeiro ciclo, sem aumento de neutropenia, infecção ou hepatotoxicidade. As taxas de resposta ao tratamento foram semelhantes entre os grupos (H: 81%; C: 83%), assim como a SG (p = 0,097), porém a SLP foi inferior no grupo H (p = 0,007).
Discussão e conclusãoA administração inicial de doxorrubicina em doses superiores às recomendadas em bula, embora associada a maior necessidade transfusional, demonstrou segurança nesta coorte. Apesar de não ter sido observado aumento na mortalidade, é essencial manter monitoramento rigoroso em pacientes com disfunção hepática no diagnóstico. Estudos futuros são necessários para esclarecer melhor o impacto prognóstico da hiperbilirrubinemia na sobrevida livre de progressão e para definir estratégias terapêuticas padronizadas.




