
A imunodeficiência comum variável (IDCV) é a imunodeficiência primária sintomática mais comum. Relatamos um caso de IDCV em um paciente jovem, com histórico de esplenomegalia e púrpura trombocitopênica idiopática.
Material e métodosTrata-se do relato de um caso de imunodeficiência comum variável (IDCV) em um paciente atendido em um Hospital terciário no sul do Brasil.
Relato de casoPaciente masculino, 39 anos, branco, que procurou atendimento por icterícia, cansaço e dispneia. Apresentava histórico de púrpura trombocitopênica idiopática responsiva a corticoide e esplenomegalia sem causa identificada. Paciente tinha biópsia de medula óssea prévia sem alterações. Na investigação de quadro clínico atual, foi evidenciado anemia hemolítica auto imune com anticorpos IgG positivo ++++. Realizada investigação de causas relacionadas a anemia hemolítica, com marcadores de autoimunidade e sorologias negativas, exames tireoidianos e vitamina B12 com valores normais, tomografias cervical, tórax e abdome sem demais alterações. Iniciada imunossupressão com prednisona 1 mg/kg/dia, com redução progressiva de níveis de hemoglobina, chegando a valores de 3,2 g/dL em 1 semana de corticoterapia. Ampliamos a investigação com a solicitação de imunoglobulinas, todas com valores reduzidos: IgA 19 mg/dL, IgE < 15,7 mg/dL, IgG 260 mg/dL e IgM 13 mg/dL. Solicitada avaliação de equipe de imunoterapia e iniciada reposição de imunoglobulina G humana 400 mg/kg, com resposta progressiva nos níveis de hemoglobina e redução dos marcadores de hemólise. Paciente não apresentava história prévia de infecções de repetição e apresentava aparente redução de resposta vacinal, com nível de anti-hbs<10. Recebeu alta com retorno ambulatorial com equipes de hematologia e imunologia e redução progressiva de corticoide.
DiscussãoA imunodeficiência comum variável (ICV) é caracterizada por hipogamaglobulinemia e produção prejudicada de imunoglobulina específica (Ig), suas manifestações clínicas, incluem infecções bacterianas recorrentes, autoimunidade, doença pulmonar intersticial, enteropatias, linfoproliferação, malignidade e doenças alérgicas. A autoimunidade na ICV se manifesta mais comumente como citopenia autoimune, ocorrendo em 4% a 20% dos pacientes, geralmente com púrpura trombocitopênica imune e anemia hemolítica autoimune, geralmente ocorrendo isoladamente. Segundo o critério do Consenso Internacional dos Transtornos de Imunodeficiência Comum Variável (2016), os pacientes devem ter uma redução acentuada de IgG (abaixo de 2 desvios padrões), bem como uma diminuição de IgM ou IgA, além de uma única resposta vacinal anormal e exclusão de causas secundárias de hipogamaglobulinemia. A ICV é igualmente prevalente em homens e mulheres. O tratamento é baseado na reposição de imunoglobulina G endovenosa ou subcutânea, sendo as doses sugeridas de 400 a 500mg/kg a cada três a cada quatro semanas. O transplante de células tronco é uma opção que favorece a reconstituição imune desses pacientes.
ConclusãoA imunodeficiência comum variável é uma condição que deve ser suspeitada em pacientes com imunodeficiência e infecções recorrentes. Doenças autoimunes concomitantes, como anemia hemolítica e trombocitopenia imunológica, podem apoiar ainda mais o diagnóstico. No caso ilustrado, as manifestações hematológicas foram mais expressivas e possibilitaram a suspeita diagnóstica.