Objetivo: Analisar os perfis das notas técnicas(NT) dos anticoagulantes orais diretos (DOACs) disponíveis no e-NatJus para consultas por magistrados.
Material e métodos: Estudo documental descritivo que utilizou dados secundários da plataforma e-NatJus. A busca ocorreu em maio-junho de 2020 e teve como critério de inclusão todas as NT que se tratava de solicitação dos DOACs. Para identificar as NT foram utilizadas 17 palavras-chave na busca, sendo encontradas 1.317 NT. Foi feita análise criteriosa por duas pesquisadoras e excluídas NT duplicadas, pareceres técnicos, NT referentes a outros medicamentos ou procedimentos. Foi realizada uma análise descritiva, sendo apresentados valores absolutos e relativos das variáveis analisadas.
Resultados: Foram incluídas no estudo 181 NT, 67% se tratava do medicamento rivaroxabana, 16% apixabana, 12% dabigatrana e 5% edoxabana. A média de idade foi de 66 anos, a maioria era do sexo masculino (50,3%). Dentre as 99 cidades com suas respectivas varas jurídicas que solicitaram suporte na plataforma, a cidade mais observada foi São Sebastião do Paraíso/MG (5%), seguida por Londrina/PR (4,4%). Dos 13 Estados observados nas NT, o mais presente foi Santa Catarina (35%). Os diagnósticos mais prevalentes foram fibrilação atrial (31,5%) e tromboembolismo venoso (16,4%). Quanto as evidências sobre eficácia e segurança dos DOACs comparados ao anticoagulante oral fornecido pelo SUS (varfarina), 61,3% das NT relataram que o medicamento solicitado apresentava maior comodidade, 38,1% que o medicamento era mais seguro, 71,3% que o medicamento não é inferior, 3,9% que o medicamento é superior e 11,0% que o custo do medicamento é maior. Além disso, em (13,8%) NT não houve citação de nenhuma referência bibliográfica. Observou-se que 57,5% tiveram a conclusão não favorável para disponibilizar o medicamento solicitado. Dentre as 77 NT que tiveram a conclusão favorável, (57,1%) não avaliaram as recomendações da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS.
Discussão: Atualmente temos assistido uma crescente intervenção do Poder Judiciário referente à demanda de medicamentos através de processos judiciais. Um grande passo foi dado em 2016, onde o Conselho Nacional de Justiça por meio da Resolução 238/2016 em parceria com o Hospital Sírio Libanês e o Ministério da Saúde implementaram o sistema “e-NatJus”para contribuir com as decisões judiciais. A utilização da plataforma ainda deve ser divulgada e implantada no país de forma efetiva, visto que dos 5.570 municípios brasileiros apenas 99 foram observados nas NT, e das 27 unidades federativas somente 13 que foram descritos nas NT. Em relação à prescrição de DOACs, entre 2013 e 2015 houve um aumento de aproximadamente 127,3%, sendo os mais prescritos dabigatrana e rivaroxabana, enquanto a varfarina teve um declínio de 8,2%.
Conclusão: Em um panorama geral nossos achados demonstraram que a maioria das NT que concederam parecer favorável não consultaram a CONITEC e não apresentaram uma evidência cientifica que contemplava de forma irrefutável sua decisão. Sabendo que a judicialização da saúde, em especial de medicamentos, mesmo que seja de forma consciente e responsável ainda é um entrave visto nos olhares dos gestores e estudiosos na área e que o acesso ao sistema de justiça não é igual para todas as classes sociais, se torna importante conhecer o perfil dos pacientes em uso de DOACs para avaliar se a prescrição desses medicamentos tem sido realizada de forma racional.